O GLOBO, n 32.320, 01/02/2022. Política, p. 6
Nogueira libera PP nos estados para “trair'' presidente na TV
Mariana Carneiro
Diretórios regionais poderão ceder inserções até para rivais do bolsonarismo
O ministro da Casa Civil e presidente licenciado do PP, Ciro Nogueira, decidiu no início do mês que os diretórios estaduais do partido podem usar como quiser o tempo de TV distribuído pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às legendas no primeiro semestre.
Com isso, caciques regionais que não apoiam Bolsonaro estão desobrigados de veicular conteúdo pró-governo e podem até entregar seu tempo de exibição a inimigos políticos do presidente, como informou o blog da colunista Malu Gaspar.
No caso do PP, serão 40 inserções de 20 minutos ao longo do primeiro semestre. A decisão de Ciro, formalizada em uma mensagem de WhatsApp aos correligionários, foi bastante comemorada entre as várias lideranças da legenda que ou não têm interesse em associar sua imagem à Bolsonaro ou até pretendem apoiar adversários do presidente.
Em São Paulo, por exemplo, para o governo do estado, boa parte dos deputados ainda prefere Rodrigo Garcia — candidato de João Doria à sucessão —ao ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, que é o nome de Bolsonaro.
No Rio, o prefeito de Nova Iguaçu, Rogério Lisboa (PP), pretende apoiar Cláudio Castro para o governo do estado e Lula para presidente. Na Bahia, o vice do governador petista Rui Costa é João Leão, do PP, que deve sair candidato ao Senado na chapa com Jaques Wagner, do PT.
CONGRESSO É PRIORIDADE
O deputado Ricardo Barros, uma das principais lideranças nacionais do partido, explica como vai funcionar:
—Se o PP de São Paulo decidir ir com o Rodrigo Garcia, o PP vai ceder o tempo para o Rodrigo Garcia. Se na Bahia, for com o PT, o tempo de TV vai para o PT.
Na interpretação dele e de outros líderes do PP, a decisão de Ciro Nogueira valerá também para a segunda etapa da corrida eleitoral, quando começarão a ser veiculadas as propagandas eleitorais.
Barros diz que a prioridade do PP na eleição deste ano é eleger deputados e senadores, mesmo que isso signifique aumentar a exposição de rivais de Bolsonaro.
—A orientação nacional é tentar alinhar com o candidato do Bolsonaro, mas orientação não é obrigação. A prioridade é aumentar a bancada. Cada estado fará composições para isso.
Questionado a respeito desses movimentos, Ciro Nogueira disse ao GLOBO na semana passada que o PP não é o único partido no qual isso acontece e que “essas posições têm que ser respeitadas ”.
Mas nem todo mundo concorda com a decisão dele. Para os grupos bolsonaristas do partido, o ministro da Casa Civil está tentando manter um pé em cada canoa.
— Não acho certo o que o partido está fazendo com o Bolsonaro. Quando ele perceber, não terá o tempo de TV do PP, que nos estados será entregue a outros partidos. O Ciro está fazendo o plano B dele — disse um integrante do PP sob reserva.
Não se trata de um assunto menor para o presidente. No entorno de Bolsonaro, muitos apostam que, à diferença de 2018, quando a campanha foi feita exclusivamente pelas redes, desta vez ele terá de fazer política da forma tradicional, o que inclui bom uso da TV.