Título: O controle social do Sistema S
Autor: Dirceu, José
Fonte: Jornal do Brasil, 29/05/2008, Opinião, p. A8

A discussão está polarizada ¿ governo, de um lado, a maioria das entidades empresariais, de outro ¿ mas ela é saudável e mais do que necessária. O alvo é o Sistema S, nome pelo qual é conhecido o sistema de aprendizagem e ação social, fundado nos anos 40 e sustentado com recursos públicos compulsórios, provenientes da cobrança das empresas de um percentual sobre a folha de salários. Esses recursos são direcionados para as entidades empresariais administradas pelas confederações empresariais da indústria, comércio, agricultura, transporte e cooperativismo.

Ninguém ignora a contribuição dada à formação profissional pelos cursos do Senai e Sesc, nem a relevância das atividades de cultura e lazer do Senac e Sesi. Mas há tempos as centrais sindicais de trabalhadores têm cobrado mais controle social sobre esses recursos. Como decorrência, o governo, por meio dos ministérios da Educação, do Trabalho e do Desenvolvimento Social, apresentou propostas de mudanças no funcionamento do chamado Sistema S.

As críticas feitas ao atual modelo incluem falta de transparência na gestão dos recursos, dos cursos e atividades do sistema. Em casos extremos, há, até, acusações segundo as quais muitos sindicatos do empresariado confundem seus recursos com os das entidades do Sistema S e cobrem gastos com pessoal e direção com recursos que não são seus.

A questão mais grave, no entanto, foi levantada pelo ministro da Educação, Fernando Haddad, que fez eco a uma velha cobrança dos sindicatos: trata-se, entre outros pontos, da cobrança de anuidades nos cursos de profissionalização do Senai e Senac, da curta duração dos cursos técnicos, e do critério de distribuição de recursos com base na arrecadação de cada Estado ou entidade, e não nas suas necessidades ou em seu desempenho.

Para superar o que considera distorções do Sistema S, o governo propôs que um conselho gestor tripartite (empresários, trabalhadores e governo federal) definisse a estratégia das entidades de formação profissional e ação social, apoiada em princípios como a gratuidade dos cursos para alunos de escolas públicas ou bolsistas de escolas particulares, e a distribuição dos recursos conforme o desempenho e eficiência de cada entidade, do número de alunos matriculados e da qualidade dos cursos.

Apesar de razoáveis, as propostas foram rechaçadas pelas entidades sindicais das empresas, que acusam o governo de querer estatizar o Sistema S e se apropriar dos seus recursos ¿ cerca de R$ 8 bilhões em 2008, sendo R$ 4,8 bilhões para ação social e R$ 3,2 bilhões para cursos técnicos. Essas entidades argumentam, ainda, que o governo, que não consegue administrar a educação pública, não poderia ter a pretensão de traçar as diretrizes e políticas do Sistema S, tarefa que, insistem, caberia a elas. São as empresas, dizem, que sabem quais as demandas do setor produtivo e não o governo.

Em defesa de sua tese, o governo argumenta que, como os recursos do Sistema S são públicos, seu uso poderia estar sujeito à licitação e sua gestão dependeria de concurso público. Por isso, quer mudanças como o aumento da carga horária dos cursos ¿ os R$ 3,2 bilhões, mesmo assim, seriam suficientes para a formação de 800 mil técnicos/ano ¿ e ampliação de 40% para 60% do volume de recursos aplicado em aprendizagem.

Com o avanço do debate, que mal começou, as distâncias entre as posições, espera-se, tendem a se encurtar. Para isso, a discussão não pode ser reprimida por pressão das entidades empresariais. Afinal, o controle social dos recursos e atividades do Sistema S, e não sua estatização como insinuam os que querem impedir mudanças, é mais do que necessário.

Como estamos falando de recursos públicos, o Sistema S tem de dar satisfação não só às entidades empresariais, como alegam seus dirigentes, mas a todos os cidadãos. Para evitar distorções, como as taxas administrativas que as federações e confederações empresariais cobram das entidades do sistema S para gerir as atividades de formação e ação social.