Título: Depoimento aponta tráfico de inflência e até crime
Autor: Fausta, Cristina
Fonte: Jornal do Brasil, 06/06/2008, JB Brasília, p. R6

Ex-chefe de necrópoles confirma que o setor nunca foi fiscalizado DESCULPA ­ Marcos Antônio Gomes dos Santos justifica falta de estrutura para fiscalizar cemitérios Cristina Fausta A CPI dos Cemitérios constatou ontem o tráfico de influência no processo de licitação do setor funerário e pode ter havido um crime no processo licitatório, que teve início em 1999 e ainda hoje não está fechado. Ontem o ex-chefe de necrópoles do GDF, Marcos Antônio Gomes dos Santos, responsável pela fiscalização do setor funerário e dos cemitérios no período de 2003 e 2004, foi ouvido pela CPI dos Cemitérios. A intenção era que ele repassasse informações sobre a fiscalização, mas o depoimento tomou outro rumo, e ficou centrado na escuta telefônica da Polícia Civil de Goiás, que flagrou uma conversa de Marco Antônio com Carlos Resende, advogado do Sindicato das Funerárias. O diálogo interceptado sugere que o servidor público tentava beneficiar um grupo de funerárias comandado por Felismino Alves, presidente do sindicato e dono de várias funerárias no DF, inclusive da Funerária Portal do Sol, em Sobradinho, onde a CPI encontrou vísceras humanas em sacos de lixo. A CPI apresentou transcrições de conversas telefônicas em que Marcos Antônio discute com o advogado a exclusão de outros empresários das reuniões para tratar da licitação do setor. Marco Antônio negou que tivesse proximidade com os empresários do setor funerário. Mas a escuta telefônica revela que havia uma relação de promiscuidade e impessoalidade entre o servidor público e alguns empresários. Informações privilegiadas Para o presidente da comissão, deputado Rogério Ulysses (PSB), a transcrição das gravações revela que Marcos Antônio passava informações privilegiadas ao grupo comandado por Felismino Alves. ­ O que a gente percebe é que existia uma licitação contaminada, com tráfico de influência e corrupção. Era uma licitação direcionada que até hoje não foi feita. Há mais de nove anos tentam fazer uma licitação para regulamentar o setor funerário e, até hoje, a normatização não saiu devido ao tráfico de influência ­ disse Rogério Ulysses. A interceptação dos telefones de Marcos Antônio e do advogado Carlos Rezende se deu porque a Polícia Civil goiana investigava uma falsificação de documentos para a cremação de uma espanhola, em Valparaíso, como explicou a deputada Érika Kokay (PT). ­ A investigação da polícia goiana não tinha nenhuma ligação com Distrito Federal. Mas no meio das gravações apareceu essa conversa que envolvia o processo de licitação do setor funerário com DF ­ afirmou a petista. Segundo Érika Kokay, fica claro na conversa gravada que Marcos Antônio passava informações privilegiadas a Felismino Alves e outros empresários ligados a ele. Na conversa, Marcos Antônio avisa ao advogado para tomar cuidado com o consultor funerário Aloísio Bittar. O diálogo sugere que o consultor poderia estar jogando dos dois lados, assessorando o grupo de Felismino e outro grupo menor, encabeçado por Baltazar Batista, dono da Funerária Santo Antônio, em Taguatinga. Aloísio Bittar foi assassinado com quatro tiros, em Goiânia. ­ Com certeza essa morte tem algumas relação com processo de licitação. Esse é um setor violento e é um mercado de disputas imensas ­ afirma a petista. Sem fiscalização Marcos Antônio disse que seus superiores sabiam que não havia condições para realizar a fiscalização. Ele admitiu que tinha conhecimento sobre as irregularidades do setor, mas se via de mãos e pés atados por devido à falta de estrutura para realizar o trabalho. ­ Eu não tomei nenhuma providência para fiscalizar o setor. Há um processo de licitação em curso desde 1999, para regulamentar o setor. Não havia fiscalização porque não havia regulamentação. Ou se fechava todas as funerárias ou se legalizava. Nossa tentativa era legalizar - disse o Marcos Antônio. Marcos Antônio trabalhou na Secretaria de Ação Social no período de 2003 a 2004 e foi presidente da comissão de licitação do sistema funerário, que foi lançada em 1999 e até o momento não foi concluída. Para o deputado Antônio Reguffe (PDT), Marco Antônio deveria sair da Câmara Legislativa preso, não por mentir, mas por não ter feito a fiscalização, que era sua função dele no GDF. ­ Ele simplesmente recebia um salário da população para fazer algo que ele nunca fez. Ouvir estas declarações me indigna como cidadão. Ele deveria ter saído daqui hoje preso, não por mentir, mas ter a cara-de-pau de afirmar que nunca fez a fiscalização. Ele ainda acha que tudo que aconteceu foi normal e justifica que não fiscalizou porque não tinha estrutura. Ele que pedisse demissão ­ disse Reguffe. Em sua defesa, Marco Antônio disse, por diversas vezes, que a estrutura o impedia de realizar atividade-fim de seu cargo. ­ Eu era apenas um funcionário subalterno, eu não tinha o que fazer, uma vez que não existia regulamentação. Eu me via obrigado a seguir o modelo de gestão da secretaria. Tentei fazer o melhor, mas não tive como desenvolver minha atividade devido ao modelo de gestão da época ­ justificou ele. Na próxima quinta-feira, a CPI deve ouvir Francisco Moacir Pinto, sócio majoritário do consórcio Campo da Esperança, empresa que administra os seis cemitérios do Distrito Federal.