Título: O poder da comunicação
Autor: Passarinho, Jarbas
Fonte: Jornal do Brasil, 01/07/2008, Opinião, p. A9

Os governos do ciclo militar eram avessos a mostrar ao povo as realizações que recomendavam os governantes como bons administradores. De Castello Branco ouvi que isso é demagogia. Mas quase igual foi Fernando Henrique. Como homem de esquerda ¿ que dizia não abrir mão de dizer que o era ¿ seguia o princípio socialista do século 19, a distribuição, ao contrário do capitalista favorável ao crescimento.

Ministro do Trabalho e da Previdência Social, dei solução a três greves, duas sem nenhuma prisão, antes do AI-5. Apazigüei os canavieiros de Pernambuco, com o auxílio não declarado e distante de Dom Helder. Ao término, propus, e o presidente Costa e Silva concordou, o Plano Básico da Previdência Rural, o Funrural, com custeio orçamentário adequado. Da festa da inauguração do pagamento de benefício, promovida pelos canavieiros no Recife, não participei. Pedi ao presidente do INPS que me representasse.

A Constituinte de 1977/78 dobrou, para um salário mínimo, sem custeio próprio, o auxílio ao rurícola, com vistas às eleições iminentes, e instituiu a Seguridade Social, obrigando a Previdência a assistir à toda a população, contribuinte ou não do INSS. Apareceu o déficit da Previdência, ampliada por benefícios sem custeio. Fernando Henrique ao término do segundo mandato declarou que o Funrural era o maior programa de renda mínima do mundo.

Não viajava tanto quanto Lula, mas conhecia as políticas sociais do Ocidente. Nunca exploramos isso nas eleições mantidas durante todo o ciclo militar em que perdíamos progressivamente os votos para o MDB, ao contrário de Fidel, democrata que, desde que permitiu eleições, sempre as vence por mais de 90% "Corrida de cavalos, com um cavalo só" disse um premiê inglês. A segunda greve foi em Contagem, perto de Belo Horizonte. Reconheci que a aplicação do PAEG estava sofrendo com a inflação e os metalúrgicos de Minas pagavam por isso. Voltei a Brasília, expus o problema ao presidente Cosa e Silva, sugerindo um abono para compensar a perda e à noite comuniquei a concessão do abono. Cedo, de manhã, as usinas estavam funcionando.

Ao tomar o avião regressando a Brasília, li no jornal que o presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro havia me criticado por "estar deformando a lei da política salarial"... Já Roberto Campos, autor do PAEG, em seu livro Lanterna na popa, elogia minha iniciativa reconhecendo a necessidade de alterar a lei, adaptando-a à realidade da inflação, o que foi feito por mensagem do presidente Costa e Silva encaminhada ao Congresso.

Nunca soubemos tirar partido do feito junto aos trabalhadores. A terceira greve, essa foi política, com ocupação das fábricas e os metalúrgicos armados com barras de ferro. A retomada das fábricas só foi possível com luta de que decorreram prisões

Quase a mesma aversão à propaganda ocorreu com Fernando Henrique Cardoso, em que havia Bolsa Escola, Vale Gás e Bolsa Alimentação para os pobres. Só do Bolsa Escola se fazia a propaganda, graças ao empenho pessoal do então governador do Distrito Federal, hoje senador Cristovam Buarque. Chegando ao governo, Lula juntou todos os benefícios, batizou o conjunto como Bolsa Família, demitiu o senador Cristovam do Ministério da Educação para não ter de dividir com ele o impacto do Bolsa Escola, e aumentou o total a pagar (que já recebeu, neste ano eleitoral reajuste médio de 8%) e aumento do benefício para 18 anos de idade.

A propaganda é permanente. Cinqüenta e nove milhões de famílias são beneficiadas, ao passo que do Fome Zero, que deveria ser o carro-chefe da política social, nem mais se fale, do mesmo modo o 1º emprego para jovens, copiado da França quando socialista, ambos fracassados e desaparecidos do noticiário. A propaganda, bem feita, transformou o que Lula, na oposição, chamava de esmolas, num fabuloso estoque de votos garantidos em próximas eleições. O lado positivo do Bolsa Família foi conseguir o que até então não se conseguira: a repartição da renda, embora depois uma pesquisa recente, feita com 5 mil beneficiados pela Bolsa Família, financiada pelo governo, concluir que ela " aplaca a fome, mas não acaba com a miséria". Mas já há muito mais quem come melhor feijão, arroz e açucares, no segmento inferior da pobreza.

Há, porém, efeitos negativos, entre eles o do "efeito preguiça", não procurar emprego ou qualquer tipo de trabalho quem tem renda cativa, ainda que baixa. Como disse a um jornalista, que perguntava sobre os escândalos no governo, uma senhora beneficiada pela Bolsa Família: "Sei que há ladrões, que há quadrilhas, mas meus filhos não têm mais fome". Bem dizia o Chacrinha em seus tempos áureos: " Quem não se comunica se trumbica".