Título: Uma legião de mães adolescentes
Autor: Abade, Luciana
Fonte: Jornal do Brasil, 04/07/2008, País, p. A3

Elas iniciam sua vida sexual cada vez mais cedo. Daí para a gravidez indesejada é um pulo.

As mulheres brasileiras estão iniciando a vida sexual cada vez mais cedo. Em 1996, 11% delas, em idade fértil ¿ 15 a 49 anos ¿ tiveram a primeira relação sexual aos 15. Em 2006, o número subiu para 32,6%. A vida sexual precoce acarretou o rejuvenescimento do padrão reprodutivo: enquanto em 1996 a média de idade para o primeiro filho era de 22,4 anos, em 2006 passou a ser de 21 anos. Os dados fazem parte da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) 2006, divulgada ontem, em Brasília, pelo Ministério da Saúde.

No mesmo período, o número de mulheres que já são mães aos 19 anos passou de 14% para 16%. O total de jovens de 15 a 19 anos que se declararam virgens caiu de 67,2% para 44,8% no período.

As cirurgias de esterilização em mulheres deixaram de ser o principal meio contraceptivo. O número desse tipo de intervenção cirúrgica caiu de 27,3% em 1996 para 21,8% em 2006. Por outro lado, o número de esterilizações masculinas dobrou no mesmo período: de 1,6% para 3,4%. O uso de preservativo e a relação com homens esterilizados são maiores no grupo de mulheres com mais de 12 anos de estudo.

Filhos desejados

Segundo a pesquisa, 54% dos nascimentos dos últimos cinco anos foram desejados pelas mães. Mas 46% ocorreram em um momento não desejado. Falha dos métodos contraceptivos, uso inadequado e descontinuidade na distribuição gratuita dos mesmos são, na opinião da coordenadora pesquisa, Elza Berquó, os motivos para um número tão alto de gravidez indesejada.

Para o chefe da Ginecologia do Hospital Universitário de Brasília (HUB), Antônio Carlos Rodrigues, a questão cultural é um dos motivos que levam as jovens a engravidarem mais cedo.

¿ Existe uma certa resistência das famílias em apoiarem os médicos e as escolas no discurso da prevenção ¿ diz. Elas (as famílias) acreditam que a discussão é um estímulo.

Segundo o médico, muitas gestações indesejadas acontecem por falta de gestão do Ministério da Saúde, quanto a distribuição dos métodos contraceptivos.

¿ Nesse momento, no hospital universitário da capital do país, não tem DIU para as pacientes ¿ denunciou.

Existe ainda o diferencial por escolaridade. Em 2006, a taxa de fecundidade entre as mulheres sem escolaridade era de 4,4, enquanto entre as mais escolarizadas era de 1,5.

¿ São dois Brasis. Um da mulher pobre que engravida cedo e outro da mulher rica que pode adaptar sua vontade de ser mãe ao seu projeto de vida ¿ afirmou a pesquisadora Tânia Lago.

A quantidade de consultas de pré-natal aumentou nos meios urbano e rural. O número de mulheres que nunca realizou um pré-natal no campo caiu de 31,9% para 3,6% entre 1996 e 2006 e no meio urbano a queda foi de 8,6% para 0,8%. No entanto, a realização de pelo menos seis consultas de pré-natal ocorreu em apenas 77% das gestações.

De maneira geral, o atendimento de saúde às mulheres do campo melhorou. O número de partos domiciliares passou de 19,8% para 3,5%. A presença do médico durante o parto nesse mesmo meio subiu de 57,7%, em 1996, para 82,6%, em 2006.

O número de esterilizações femininas realizadas durante o parto cesárea permaneceu em 59% no período a que se refere a pesquisa. O crescimento de cesáreas no Brasil, tanto no meio rural como no urbano, é uma preocupação do ministério, que lançou, no último mês de maio, uma campanha de incentivo ao parto normal.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse que investigará a informação de que 31% das gestantes não receberam nenhuma dose da vacina antitetânica. Para o ministro, a constatação é paradoxal, uma vez que 77% das gestantes chegaram a ter, pelo menos, seis consultas pré-natal.