Título: Prefeitos sacam dinheiro público direto no caixa
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 22/01/2005, País, p. A2

Investigação descobre verba federal desviada por autoridades sem artifícios

BRASÍLIA - Alguns prefeitos nem se preocupam mais em criar artifícios para dilapidar os cofres públicos. No municípios de Itaíba (BA) e Águas Belas (PE), eles sacavam o dinheiro de convênios do governo federal direto no caixa do banco, conforme investigação conjunta da Controladoria-Geral da União (CGU) com a Polícia Federal.

A investigação da CGU incluiu os últimos quatro anos. Em 2001, foram registrados saques no total de R$ 144 mil em cheques da prefeitura na boca do caixa. A CGU descobriu que nos documentos da prefeitura constam cheques datilografados, nominais a 20 credores. Mas as cópias microfilmadas mostra os mesmos cheques manuscritos e descontados na boca do caixa, com endosso do prefeito Claudiano Ferreira.

O mesmo esquema voltou a ser utilizado por outro prefeito de Itaíba em 2002. Um total de R$ 196 mil do programa Educação de Jovens e Adultos foi sacado na boca do caixa, com endosso do prefeito. Dessa vez, o responsável foi o prefeito Brás José Nemésio Silva, segundo a CGU. De novo, a prefeitura apresentou cheques datilografados em nome dos fornecedores, mas a CGU foi atrás das cópias microfilmadas dos mesmos cheques e encontrou saques da prefeitura na boca do caixa, com endosso do prefeito.

As fraudes deram um prejuízo total de R$ 1,5 milhão à Prefeitura de Itaíba. Além dos cheques descontados no caixa, os prefeitos se utilizaram de empresas fantasmas para desviar dinheiro. Em 2002, a prefeitura comprou R$ 50 mil em materiais da empresa Valdete Gomes Importação e Exportação, firma irregular. Em depoimento à Promotoria Civil, Valdete Batista do Nascimento declarou não ser dona nem sócia da empresa, mas que sua família recebeu R$ 20 para emprestar os documentos a um homem chamado Everardo Rodrigues Bezerra.

Em Águas Belas (PE), vários cheques também foram sacados na boca do caixa, com endosso do prefeito e do tesoureiro do município. Na lista de responsáveis pelas irregularidades estão o prefeito Nomeriando Ferreira Martins. O prejuízo total das irregularidades em Águas Belas atinge R$ 2,8 milhões.

Em Serra do Ramalho (BA), o prefeito Alberto Anísio Souto Godoy fraudou licitações e sacou dinheiro do fundo da educação, o Fundef, com notas clonadas. Para sacar R$ 99 mil do Fundef no banco, o prefeito recorreu a uma suposta licitação com a Construtora Guimarães, para a construção de dois grupos escolares. A construtora informou à CGU que nunca prestou serviços à prefeitura.

Nos registros da prefeitura de Serra do Ramalho, consta na ata de uma licitação a presença do dono do Supermercado Serra do Ramalho, que informou à CGU jamais ter participado das tais reuniões. O Supermercado Serra do Ramalho emitiu notas fiscais ''calçadas'' para a prefeitura. A prefeitura recebia notas fiscais com variações até 200% acima do valor real da compra. Interrogado pela PF, o dono do supermercado confirmou ter emitido notas falsas para sonegar impostos.

Na mesma Serra do Ramalho, a CGU, sob a presidência, de Waldir Pires, não conseguiu encontrar os 25 quilômetros de construção e recuperação de estradas, com dinheiro transferido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário. ''Nem o prefeito nem a Caixa comprovaram documentalmente sequer a localização da obra'', dizem os auditores. A CGU colocou no rol de responsáveis pela irregularidade a supervisora da Caixa Econômica Federal em Itabuna (BA), Giltânia Santos Silva Menezes.

Em outro convênio para a construção e recuperação de outros 20 quilômetros de estradas em Serra do Ramalho, com dinheiro do Ministério da Integração Nacional, nem o prefeito nem a Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf) conseguiu localizar a obra. Na lista de responsáveis, estão o superintendente da Codevasf, Jonas Paulo de Oliveira Neves, e o ex-superintendente, Antônio Coelho. Dos R$ 14,3 milhões repassados para Serra do Ramalho, a prefeitura utilizou R$ 1,6 milhão em operações irregulares.