Título: PF implode megaquadrilha no MS
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 05/08/2008, País, p. A10

`Beira-Mar¿, `Alemão¿ e o colombiano Abadía planejavam seqüestros para negociar liberdade.

BRASÍLIA

Numa ação cercada de segredos, a Polícia Federal abortou, ontem, a formação de uma megaquadrilha, chefiada por três pesos pesados no ranking do crime organizado ¿ Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, Juan Carlos Ramirez Abadía, chefe de um dos grandes cartéis colombianos de cocaína, e o maior financiador das ações do Primeiro Comando da Capital (PCC), José Reinaldo Girotti, o Alemão ¿ recolhidos atualmente na Penitenciária Federal de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande. O grupo organizava, de dentro da cadeia de segurança máxima, a formação de uma gangue especializada em seqüestros cujos alvos seriam autoridades do judiciário federal e políticos de Mato Grosso do Sul e de outros Estados.

¿ Nesse momento não podemos colocar em risco o sucesso da operação ¿ explicou a juíza federal Raquel Domingues do Amaral Corniglion, que decretou a prisão dos suspeitos, entre eles, a ex-mulher de Beira-Mar, Ivana Pereira de Sá, detida quando visitava, ontem, o traficante, e o advogado de Alemão, Vladimir Búlgaro, apanhado em São Paulo. Chamada de Operação X, a ação da Polícia Federal estendeu-se a Nova Andradina (MS), na divisa com São Paulo, e pegou outros dois homens, Leandro Oliveira Santos e Leonice de Oliveira, parentes do traficante João Paulo Barbosa, também preso em Campo Grande e apontado como integrante da quadrilha.

Preservar investigações

¿ A decisão de não divulgar mais informações tem como única finalidade preservar as investigações ¿ disse a juíza, titular da 3ª Vara Criminal da Justiça Federal de Mato Grosso do Sul.

No meio da tarde de ontem ela determinou que fosse suspensa uma entrevista coletiva que seria dada em Campo Grande pelo superintendente da Polícia Federal no Estado, Luiz Adalberto Philippsen, aumentando o mistério sobre o caso. Invocou a Lei da Magistratura e o segredo de justiça decretado nas investigações para justificar a medida. As explicações oficiais sobre a operação se resumiram a uma nota com os nomes dos líderes encerados em Campo Grande e os suspeitos presos ontem.

A principal suspeita é a orquestração de uma grande trama em função dos perfis dos dirigentes da quadrilha. Nos bastidores da polícia circulavam ontem informações sobre a descoberta de uma suposta lista com os nomes de várias autoridades cuja finalidade seria livrar da prisão homens que passarão atrás das grades a totalidade da pena máxima prevista no Brasil, 30 anos.

As prisões foram o desfecho de seis meses de vigilância em torno da quadrilha através de grampo telefônico autorizado pela justiça, investigações em torno de contas bancárias e movimentação dos suspeitos encarregados de agir dentro e fora das cadeias. A investigação começou em março, depois que um grupo armado disparou contra a prisão e um helicóptero sobrevoou a área numa ação que a polícia classificou como frustrada tentativa de resgate.

Como Abadía, Beira-Mar e Alemão já se encontram presos, a Polícia Federal acredita que a descoberta da quadrilha e os planos de seqüestro irão mantê-los por mais tempo em regime disciplinar diferenciado, além de agravar as penas. Os três foram ouvidos ontem à tarde na Superintendência da PF em Campo Grande e depois levados de volta às celas. O trio representa o que há de mais periculoso no crime organizado. A união entre os três grupos, segundo a polícia, daria mais trabalho às autoridades do que o PCC, que já tem vasta experiência em planejar ações de grande envergadura a partir das prisões.

Abadía, que pode ser extraditado para os Estados Unidos, era o chefe do Cartel Vale do Norte, na Colômbia, e dono de uma fortuna estimada em mais de US$ 100 milhões; Fernandinho Beira-Mar, além de mandante de vários homicídios e traficante, tem ligações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc); e Alemão, especialista em roubo a bancos e jóias, é apontado como o homem que planejou o furto ao Banco Central de Fortaleza, de onde foram levados, em 2005, R$ 167 milhões, no maior e mais ousado assalto a banco ocorrido no país. Líder de dezenas de ações, teria guardado boa parte dos cerca de R$ 100 milhões que roubou. Pelo poderio financeiro dos três, a polícia acredita que o seqüestro de autoridades teria a finalidade de facilitar um arrojado plano de libertação do grupo.

O advogado Gustavo Bataglin, que defende Fernandinho Beira- Mar e Abadía disse ter sido informado que o motivo da operação teria sido a descoberta de um plano de fuga e desconversou sobre a articulação entre os presos para o seqüestro de autoridades. "Sempre achei que seria impossível qualquer comunicação entre eles num presídio federal", afirmou. Segundo ele, Ivana visitava semanalmente Beira-Mar em Campo Grande.