Título: Mobilização começa com trabalhador informal
Autor: Bruno, Raphael
Fonte: Jornal do Brasil, 03/08/2008, País, p. A15

BRASÍLIA

A estratégia dos anarquistas para recuperar o terreno perdido é clara: apostar em movimentos sociais marginalizados que são muitas vezes esquecidos pela esquerda mais tradicional. A FAG, por exemplo, atua principalmente junto ao Movimento dos Catadores de Papel. Já a Federação Anarquista do Rio de Janeiro (Farj) dedica sua militância ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto e Movimento dos Desempregados. Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e integrante da Farj, Alexandre Samis defende a nova estratégia. ­ São indivíduos muito mais inclinadas a radicalizar, porque são pessoas que não tem nada a perder ­ explica. ­ É diferente do empregado filiado a um sindicato, como é a maior parte da base social dos partidos de esquerda. Estamos retomando nosso vetor social perdido na década de 1930 e a visibilidade futura que venhamos a ter virá deste trabalho que realizamos agora. Medida de segurança Samis não revela quantos inte- grantes a Farj tem. "Questão de segurança", diz. Mas o historiador, que além de militante é pesquisador sobre o anarquismo, tendo escrito sua tese de doutorado sobre o tema, afirma que a idéia não é "tomar a dianteira" dos movimentos sociais dos quais a Farj participa, mas sim "construir junto com eles um projeto coletivo de sociedade". O anarquista garante que a organização tem colhido resultados. ­ Hoje o Movimento dos Sem-Teto é bastante hostil à colaboração com o Estado e não dialoga com os setores governamentais ­ afirma. ­ Não à toa, mas porque entendemos que o Estado é uma das causas do problema e é incapaz de atender estas demandas. Elas serão conquistadas pela própria ação direta das classes oprimidas.

Caminho de volta

A tentativa de se reinserir nos mo- vimentos sociais, contudo, acarretou em velhos problemas para os anarquistas: a necessidade de agir em conjunto com partidos de esquerda, presentes mesmo nos movimentos sociais alvos das investidas dos libertários. tensões e brigas. No Brasil, o mais recente foi em 2005, quando, numa manifestação contra o aniversário da invasão americana no Iraque, manifestantes anarquistas entraram no meio de militantes do PSTU gritando palavras de ordem como "o povo, unido, governa sem partido". Diferenças de enfoque Embora ambas teorias defendam a superação revolucionária da sociedade capitalista, o marxismo mais tradicional reza que os trabalhadores, organizados em um partido, devem se utilizar do Estado para desapropriar as classes dominantes e que, somente quando esta não mais existir, o Estado desaparecerá natural e gradualmente, pois sendo um instrumento de classe não mais será necessário quando as classes deixarem de existir. Já o anarquismo, como teorizado por seus principais pensadores, defende que tanto o Estado como a propriedade privada devem ser abolidos de uma só vez pela ação direta e autônoma das massas, ou seja, sem a liderança de um partido. A crítica anarquista sempre argumentou que, mantido o Estado, o partido marxista que o comandasse se tornaria uma nova classe de opressores. ­ É uma relação muito difícil ­ admite Alexandre Santos, da FAG. ­ Existem divergências muito profundas mas muito práticas também. Os partidos tem uma concepção muito vanguardista, de líderes da massa. Nas atividades públicas, sempre dão preferência de palavra às cúpulas partidárias. Mas, de repente, nem todo o mundo é do partido e pode ter algo interessante para contribuir. Você vai impedir esse camarada de falar? É complicado. (R. B.)