Título: Desaparecidos, mas poderosos
Autor: Falcão, Márcio
Fonte: Jornal do Brasil, 17/08/2008, País, p. A14

Políticos que sucumbiram a escândalos conseguem, na sombra, manter sua influência.

O envolvimento de políticos em escândalos quase sempre é um golpe na imagem pública do parlamentar, na influência e no prestígio diante de seus pares. Mas no Senado e na Câmara há exceções. O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e os deputados Jader Barbalho (PMDB-PA) e Antonio Palocci (PT-SP) são alguns dos exemplos. Ficaram no olho do furacão, quase perderam os mandatos, mas continuam em cena. Circulam com desenvoltura no Palácio do Planalto e não deixam de ser referência no Congresso. Só que, agora, trabalham nos bastidores. Renan é ex-presidente do Senado. Deixou o cargo para salvar o mandato em um acordo fechado entre os governistas, que contou com ajuda direta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Resistiu à idéia durante sete longos meses, quando diariamente era bombardeado por causa de um affaircom uma jornalista, que se transformou em crise familiar e caso de Estado diante das denúncias de que uma empreiteira teria pago suas despesas pessoais. As suspeitas não chegaram a lugar algum. Renan, no entanto, mudou. Distanciou-se dos holofotes. Adotou uma postura discreta. Faz poucos discursos, mas costuma a aparecer diariamente em plenário. Agora, está empenhado nas eleições municipais. Presidente do PMDB em Alagoas, tem se dedicado às bases, lutando pela reeleição do herdeiro, Renan Calheiros Filho, para a Prefeitura de Murici, e pela eleição da tucana Solange Jurema como prefeita de Alagoas. O cuidado com o eleitorado alagoano tem explicação: quer garantir visibilidade para se reeleger senador em 2010. Por lá, Renan ainda vive uma delicada relação com o governador Teotônio Vilela FIlho (PSDB). Quando voltar das eleições, Renan deve continuar se dividindo entre as articulações com a equipe do presidente Lula e os senadores peemedebistas. Sabe-se que o ex-presidente do Senado mantém canal aberto de articulação com pelo menos quatro ministros: Dilma Rousseff (Casa Civil), José Múcio (Relações Institucionais), Edson Lobão (Minas e Energia) e Hélio Costa (Comunicações). No Senado, há ainda quem aposte em uma reviravolta de Renan. Poderia assumir a liderança do partido na Casa. A proposta foi lançada quando o líder do partido, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), ficou envolvido em denúncias de ter recebido propina na Alstom e ainda não foi totalmente descartada. - Ele sempre foi e continua sendo um dos nossos mais importantes interlocutores no Planto ­ diz o senador Almeida Lima (PMDB- SE), que integrou à chamada tropa de choque de Renan durante a crise.

Busca por cargos

Outros são menos otimistas e não apostam mais em vôo solo de Renan. Alguns líderes avaliam que o futuro político de Renan tem uma leve semelhança com o caminho adotado pelo deputado Jader Barbalho ­ apontado por correligionários até como conselheiro do presidente Lula. Renan poderia se manter no apagar das luzes e batalhando por cargos, assim como Jader. Para o peemedebista do Pará, o que vale é conquistar seu espaço, mesmo estremecendo a base de sustentação do governo Lula e deixando para trás caciques do PMDB, como o ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP). A sede por cargos e poder, comentam aliados, é uma das características do entanto, muitos parlamentares questionam tamanha influência de um deputado que já estampou páginas de jornais algemado e que renunciou ao mandato de senador para não ser cassado e perder direitos políticos. Nas últimas nomeações do setor elétrico Jader descolou a cobiçada Eletronorte ­ com orçamento de R$ 5 bilhões ­ para Lívio Rodrigues, considerado seu braço direito, que estava no Detran do Pará. Sabe-se ainda que Jader tem outros três bons cargos no governo, mas que são tratados com discrição. ­ É curioso o tamanho da força dele ­ reconhece o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), que, em seguida, desconversa sobre o assunto. Na lista de políticos que quase sucumbiram e conseguiram virar o jogo está o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. O deputado petista já acumulava no currículo denúncias de corrupção que envolvem sua gestão como prefeito de Ribeirão Preto quando se envolveu no caso da quebra do sigilo de um caseiro e foi praticamente obrigado a deixar o governo. Era a tentativa de desmoralizar Francenildo dos Santos Costa, que afirmava tê-lo visto várias vezes na mansão alugada em Brasília por lobistas da chamada república de Ribeirão Preto relacionados ao "mensalão", esquema do pagamento de propina a parlamentares. Palocci trocou a condução da política econômica por um gabinete na Câmara. Coincidência ou não, tem postura semelhante à de Renan. Avesso à entrevistas, evita criticar publicamente o atual ministro da Fazenda, Guido Mantega, mas é figura presente no Palácio do Planalto, em conversas reservadas com o presidente Lula. Nos últimos encontros, teria criticado a criação do Fundo Soberano do Brasil e alertado o presidente sobre os problemas da proposta. Deputados comentam que Palocci não aposta no fundo e até seria favorável a retirada da urgência para acelerar a tramitação da matéria, como defendem oito partidos da base e da oposição. Só voltou a ganhar destaque como parlamentar ao assumir a presidência da comissão especial que analisa a reforma tributária. Pressão do presidente e da bancada do PT. Os petistas queriam deixar Palocci na relatoria. Um teste para a receptividade do ex-ministro. Lutaram, mas tiveram que ceder o cargo ao PR para evitar uma rebelião de alguns partidos da base aliada. Agora, com a reforma emperrada, petistas avaliam que o recuo foi melhor para preservar Palocci de carregar o fracasso de mais uma mudança no sistema tributário engavetada. Com prestígio em alta entre os companheiros, Palocci é sempre lançado como um potencial integrante da cúpula do governo, sendo cotado para Fazenda, Previdência ou Saúde. O retorno pode estar próximo, uma vez que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar em breve a denúncia do procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza contra Palocci pelo caso do caseiro. Nos corredores de Brasília, políticos garantem que Palocci será absolvido.