Título: A discussão de uma nova Lei do Petróleo ::
Autor: Pires , Adriano
Fonte: Jornal do Brasil, 19/08/2008, Economia, p. A18

Muitos afirmam que a Petrobras tem necessidade de adiar definição sobre o pré-sal.

Com a publicação no dia 17 de julho do decreto presidencial criando uma Comissão Interministerial, o debate sobre as possíveis alterações na Lei 9.748, de 1997, a chamada Lei do Petróleo está inaugurado oficialmente. A Comissão será coordenada pelo ministro de Minas e Energia, e composta pela ministra da Casa Civil, Ministro de Planejamento, ministro da Fazenda e o ministro de Desenvolvimento. Além desses, também são membros da Comissão o presidente do BNDES, o Diretor Geral da ANP e o presidente da Petrobrás. O grupo poderá ainda "convidar especialistas ou representantes de outros órgãos e entidades, públicas ou privadas, bem como cidadãos de reconhecido conhecimento na área, para participar das reuniões e prestar assessoramento sobre temas específicos". A princípio a Comissão deverá entregar uma proposta em até 60 dias. A discussão sobre as alterações na atual legislação do setor de petróleo tem como base um princípio político ­ qual deve ser o grau de controle do Estado sobre a produção de petróleo ­ e um de ordem econômica ­ se as arrecadações do governo, em termos de royalties e participações especiais são adequadas à nova conjuntura do mercado do petróleo. No caso do pré-sal, o argumento é que, devido à magnitude dos campos e ao baixo risco de exploração, o governo deveria ter maior controle da produção. Nos contratos de concessão utilizados hoje, a empresa que detém a concessão é proprietária do petróleo e faz a gestão da operação ­ decide quando e quanto vai ser produzido. Uma alternativa defendida por alguns membros do governo e da própria Petrobras seria os contratos de partilha da produção. Nesse caso, segundo os defensores deste modelo, o governo, representado por uma nova estatal, teria maior controle e seria proprietário de parte da produção do petróleo. Aí surge uma outra discussão: qual deve ser essa estatal. À primeira vista, a Petrobrás seria a mais indicada. Primeiro por ter um conhecimento ímpar do setor e segundo por já ter uma estrutura e tecnologia destinada para a atividade. No entanto, a Petrobras possui seu capital aberto e dar esse tipo de controle seria beneficiar sobremaneira seus acionistas. O governo teria, portanto, duas opções: comprar as ações que estão no mercado ou criar outra estatal para a finalidade. O ministro de Minas e Energia tem defendido a criação de uma nova estatal e o presidente da Petrobras critica essa proposta. Na realidade, essa divergência de opiniões mostra um certo desconhecimento do ministro e do presidente da Petrobras sobre os contratos de partilha da produção. Em primeiro lugar, os contratos de partilha não são os mais utilizados nos países de baixo risco exploratório, como defende o ministro e o presidente da Petrobras. Países de baixo risco exploratório adotam contratos de serviço e constituem empresas 100% nacionais, como é caso da maioria dos localizados no Oriente Médio. Por outro lado, não dá para ter contratos de partilha sem criar uma empresa 100% nacional e isso desagrada o presidente da Petrobras. Muitos afirmam que o que está por trás dessa discussão confusa é a necessidade da Petrobras adiar qualquer definição sobre o pré-sal neste momento. Isso porque a empresa atualmente não teria capacidade financeira, disponibilidade de equipamentos e mão de obra especializada para enfrentar as grandes petroleiras em leilões. Portanto, o objetivo seria postergar as definições sobre a exploração de petróleo no pré-sal. Tanto a mudança dos tipos de contratos, quanto a criação de uma nova estatal seriam objetos de alterações em lei e sabe-se que essas mudanças são morosas e burocráticas. Sendo assim, poderiam ocorrer atrasos consideráveis na licitação desses novos blocos do pré-sal, o que agradaria a Petrobras. O principio de ordem econômica é igualmente importante e poderia ser tratado de forma independente do principio político. Se não vejamos, com a descoberta do pré-sal o governo poderia exigir de imediato uma maior participação na chamada renda petrolífera. Para isso, bastaria o presidente Lula revogar o atual decreto das participações especiais e publicar um outro aumentando os seus valores. Além do mais, se as áreas do pré-sal forem colocadas em leilões os bônus de assinatura cresceriam enormemente. Tudo isso pode ser feito sem alteração na atual legislação. Uma outra discussão seria a de alterar a atual sistemática de distribuição da chamada participação governamental que inclui dentre outros os royalties e as participações especiais. Esse assunto já está sendo discutido no Congresso Nacional onde já existem projetos de lei de alguns senadores como Aloizio Mercadante e Tasso Jereissati. Esse assunto é tratado de duas formas. Os senadores propõem alterar a atual sistemática de distribuição das participações governamentais independente das descobertas do pré-sal. Em relação ao pré-sal a idéia defendida por muitos é de que deveria ser criado um fundo destinado a educação com os recursos oriundas das novas descobertas. Acho que o mais correto seria manter a atual sistemática de distribuição das participações governamentais para a produção de petróleo existente e se estabelecer uma discussão criteriosa sobre o que fazer com a riqueza do pré-sal. As autoridades do Estado do Rio de Janeiro devem ficar muito atentas a toda essa discussão. Afinal hoje é o Estado que mais se beneficia da arrecadação das participações governamentais. Essa não é uma discussão simples, pois envolve diferentes interesses. O mais importante, independente da solução que venha a ser encontrada, é manter a transparência que existe na atual legislação. É isso que dá credibilidade, atrai novos investimentos e garante a estabilidade do setor. Caso isso seja prejudicado em função de outros objetivos, principalmente os de caráter político, estaríamos adotando um modelo mais intervencionista, o que seria o pior caminho para o país.

Adriano Pires DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRA-ESTRUTURA (CBIE)