Título: Câmara apressa aumento de salários
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 24/02/2005, País, p. A3

Corre entre os deputados uma lista para que reajuste seja apreciado diretamente no plenário, sem passar por comissões

O que não falta na Câmara é manobra para que os deputados possam encher mais rápido o próprio bolso. Uma lista começou a correr ontem para que o aumento de salários seja apreciado diretamente pelo plenário, sem a necessidade de tramitar pelas comissões permanentes. Isso ocorrerá se forem obtidas 257 assinaturas.

A primeira reunião da Mesa Diretora da Câmara na gestão de Severino Cavalcanti (PP-PE) serviu para que os deputados colocassem em pauta a proposta de reajuste salarial, além de um acréscimo considerável nas verbas de gabinete. Com o aumento, os salários saltariam de R$ 12.840 para R$ 21.500, retroativos a janeiro, e para R$ 24.500 a partir de janeiro do ano que vem.

As verbas de gabinete, hoje fixadas em R$ 35 mil, poderão chegar R$ 50 mil, se o Senado conceder o reajuste de 15% nos salários dos servidores do Legislativo. Juntas, as duas propostas representam um gasto extra de R$ 177 milhões para os cofres públicos. Elas ainda precisam ser votadas pelos plenários da Câmara e do Senado.

A reunião aconteceu na residência oficial de Severino, mesmo local onde, em entrevista ao Jornal do Brasil, na última sexta-feira, o novo presidente defendeu o aumento, mas negou que tivesse pressa em propor a votação em plenário. Ontem, ele pediu ao 2º vice-presidente da Casa, Ciro Nogueira (PP-PI), urgência na tramitação das propostas.

- Se Deus quiser, estaremos votando esta matéria na semana que vem - declarou Nogueira.

A proposta da Mesa Diretora é estabelecer uma isonomia entre os salários dos parlamentares e dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Em dezembro do ano passado, o presidente do STF, ministro Nelson Jobim, encaminhou ao Congresso um projeto propondo a elevação dos salários dos ministros do STF de R$ 19,5 mil para R$ 21,5 mil a partir de janeiro deste ano e para R$ 24,5 mil a partir do início de 2006.

Quanto à verba de gabinete, os deputados têm direito a R$ 35 mil mensais para pagamentos de suas assessorias - limitadas a 20 servidores por gabinete. A Mesa Diretora propôs a aplicação de um reajuste de 25% neste valor, o que elevaria a verba para algo em torno de R$ 45 mil. Mas tramita no Senado um projeto reajustando os salários dos servidores em 15%, o que impacta as despesas de gabinete. Somando-se os dois percentuais, a verba de gabinete pode chegar a R$ 50 mil.

O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, prometeu cortar as despesas desnecessárias da Câmara. Anunciou a criação de uma secretaria para controlar os gastos da Casa, afirmando que vai rever contratos onde for detectado algum erro. Segundo ele, o dinheiro público tem que ser tratado com honestidade.

- Onde houver um ralo, eu vou tampar - ameaçou.

Ciro Nogueira afirmou que será feito um levantamento para descobrir o que é preciso reduzir para cobrir os reajustes salariais e das verbas de gabinete. Todo este esforço dificilmente conseguirá evitar a necessidade de uma verba suplementar, já que nem mesmo o reajuste de 15% destinado aos servidores estava previsto no orçamento da Câmara para este ano.

Tanto Ciro quanto Severino não se mostraram muito preocupados com possíveis danos à imagem do Legislativo. Apoiando-se nas palavras do ministro Nelson Jobim - que defende o reajuste - Cavalcanti afirmou que os ministros do STF têm melhores condições de comentar a medida do que ele próprio. Nogueira chegou a declarar que a população defende o contracheque mais gordo dos parlamentares.

- A sociedade quer um deputado bem pago, livre de pressões e lobbies, para que possa trabalhar em prol do país.

Severino voltou a se irritar com as declarações de alguns deputados, afirmando que, caso o reajuste salarial seja de fato concedido, abrirão mão do aumento. Segundo o presidente da Câmara, ele próprio vai expor o nome do deputado que, em público, se diz contra o reajuste, mas que recebe o dinheiro extra na conta.