Título: Candidaturas turbinadas
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 15/08/2008, Opinião, p. A8

A DIVULGAÇÃO pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) da primeira prestação de contas dos candidatos a prefeito e vereador revela um dado que não chega a surpreender os que acompanharam, com atenção, os pleitos anteriores. Independentemente de partido, aqueles que disputam a reeleição ­ no caso das prefeituras ­ ou os que contam com o apoio explícito de prefeitos e governadores, largam com vantagem no quesito captação de recursos de pessoas jurídicas. Seria temerário dizer, de pronto, que todos os andidatos nesta situação utilizam a máquina pública, seja estadual ou municipal, em benefício próprio. Por outro lado, negar que o processo de convencimento de doadores em potencial se torna mais fácil para este grupo é como que tapar o sol com a peneira. Empresas que fazem, fizeram ou pretendem executar qualquer tipo de negócio com governos estaduais e municipais são quase obrigadas a colaborar. Até porque sabem que o seu concorrente direto também seguirá nesta direção. É uma tradição nada republicana, mas que persiste no Brasil desde que aqui se foi depositado o primeiro voto em uma urna eleitoral. Com a adoção, recentemente, de uma legislação mais mo derna, o país cercou-se de instrumentos capazes de inibir o mais pernicioso dos males, o chamado caixa 2. Por este instrumento, empresas doam dinheiro para candidatos sem contabilidade ou recibo algum. Tais recursos, por sua vez, são repassados a terceiros sem nenhum controle. Com isto, o país é duplamente pre judicado. Não arrecada, no presente, os impostos devidos. No futuro, se o candidato for eleito, certamente será obrigado a retribuir o "favor", valendo-se, evidentemente, dos cofres públicos. Olhando-se o mapa dessa primeira leva de captação de recursos, observam-se algumas surpresas. Uma delas diz res peito ao candidato do PV PSDB-PPS à prefeitura do Rio, Fernando Gabeira, que declarou ter arrecadado até agora R$ 342.300, ficando abaixo dos líderes de arrecadação, o peemedebista Eduardo Paes (R$ 579.600) e a democrata Solange Amaral (R$ 409.400). Os dois são apoiados, respectivamente, pelo governador Sérgio Cabral e pelo prefeito Cesar Maia. Diante deste quadro, está sendo retomado, no Congresso Nacional, em Brasília, o debate em torno do financiamento público da campanhas, um dos pontos da reforma política que os parlamentares, por falta de consenso, sempre acabam deixando para depois. Por este instrumento, as doações, de pessoas e empresas, estariam proibidas. O Estado desembolsaria, a cada pleito, algo em torno de R$ 1 bilhão, que é o equivalente ao orçamento anual do Ministério da Cultura. Um por cento destes recursos seria dividido igualmente entre os 29 partidos com registro definitivo. O restante (99%), dis tribuído entre os partidos com representação na Câmara, na proporção de suas bancadas. Os diretórios nacionais ficariam com 30% para a campanha presidencial. Os 70% restantes seriam repassados aos diretórios estaduais, metade na proporção do eleitorado de cada Estado e metade na proporção das bancadas estaduais que o partido elegeu para a Câmara dos Deputados. Pelos cálculos de consultores do Congresso, com o financiamento público, o custo das campanhas cairia quase um terço. O que está sendo discutido é uma mudança radical: a pura e simples eliminação de contribuições privadas. Talvez fosse prudente se avaliar a adoção de um modelo híbrido, como existe nos Estados Unidos e, praticamente, em toda a Europa. Nestes países, o candidato opta se quer uma ou outra fonte de recurso. Uma maneira transparente e democrática de evitar que o candidato vença por estar dopado.