Título: Questão causou polêmica que divide entidades e especialistas
Autor: Carneiro, Luiz Orlando
Fonte: Jornal do Brasil, 07/08/2008, Tema do dia, p. A2

BRASÍLIA

O julgamento da ação em que a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) pede ao Supremo Tribunal Federal (STF) liberdade para que juízes eleitorais possam considerar a vida pregressa de candidatos na hora de conceder registros de candidatura gerou muita polêmica ontem. O pedido para que os chamados "ficha-suja", candidatos que tenham sido condenados em primeira instância em processos criminais ou administrativos, sejam impedidos de se eleger a cargo público dividiu opiniões de juristas e entidades.

Organizações como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) vêm encampando a iniciativa da AMB há meses. Em abril, juntamente com outras entidades que formam o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, as duas organizações lançaram o projeto de lei de iniciativa popular 9.840 para vetar candidaturas de políticos com antecedentes criminais.

Em junho, realizaram encontro com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do STF, Carlos Ayres Britto, para defender a tese. Segunda-feira passada, já antecipando o julgamento de hoje do STF, o movimento divulgou, na sede da CNBB em Brasília, carta de alerta à Suprema Corte no sentido de defender a importância da iniciativa da AMB.

Coibir o abuso

¿ O objetivo é coibir o abuso. O princípio é purificar o processo eleitoral ¿ comentou o presidente da CNBB, dom Geraldo Lyrio Rocha.

Para o presidente da OAB, Cezar Britto, a necessidade de se utilizar da situação jurídica dos candidatos para avaliar os pedidos de registro de candidaturas é uma conseqüência da incapacidade do Congresso Nacional em avançar com propostas de reforma política.

¿ Há dois anos a OAB manda sugestões ao Congresso, mas a reforma não se resolve. Os políticos estão mais preocupados com as próximas eleições do que com as próximas gerações ¿ critica Britto.

Entre advogados especialistas em direito eleitoral, contudo, a tentativa de barrar candidatos condenados em primeira instância é uma forma de tentar "driblar" a lentidão da Justiça brasileira, que acaba levando anos para concluir todo o processo de um réu.

¿ Se admitimos que uma candidatura pode ser impugnada pela mera existência de um processo, estamos falando em condenação antecipada ¿ avalia o jurista Guilherme Amorim.

Amorim questiona o que aconteceria em casos em que os réus em processos judiciais tivessem suas candidaturas negadas mas fossem inocentados no futuro.

¿ Ele ganharia uma indenização? É preciso refletir com calma. O fato da existência do processo deve ser amplamente divulgado, mas não devemos subestimar a capacidade de nossos eleitores ¿ critica.

Mestre em Direito Político, o jurista José Luiz Toro compartilha da opinião do colega.

¿ Se eu admito que toda pessoa tem direito a esgotar seus processos de defesa, a iniciativa não se justifica. Entendo que ela pode abrir um precedente bastante perigoso. A Justiça não deve ir por atalhos.