Título: Sem saída, Congresso demite
Autor: Falcão, Márcio ; Correia, Karla
Fonte: Jornal do Brasil, 22/08/2008, Tema do Dia, p. A2

O quadro de funcionários do Congresso sofreu ontem as primeiras alterações depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu o nepotismo nos três poderes. Deputados e senadores começaram a assinar os pedidos de exoneração de filhos, mulheres, irmãos, sobrinhos, cunhados e netos. No Senado, ao menos três senadores terão que demitir assessores. Segundo levantamento do Jornal do Brasil, na Câmara, pelo menos 30 deputados tinham, até ontem, familiares como seus funcionários ou trabalhando em gabinetes de colegas ­ em sua maioria do mesmo Estado ­ ocupando cargos de confiança.

O primeiro a anunciar publicamente a demissão de um sobrinho, Carlos Eduardo Alves, lotado em seu gabinete, foi o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN). O peemedebista se disse surpreso com o alcance da decisão do STF que impede a contratação de parentes até 3° grau e vai esperar uma análise da consultoria técnica da Casa sobre a súmula editada ontem pela Suprema Corte para tomar providências. ­

- Pensei que a decisão atingiria aqueles que tinham parentes no Judiciário, e não nos outros poderes ­ disse. ­ Agora, é cumprir.

Levantamento O presidente do Senado não ar- riscou comentar a situação de outros colegas que empregam a família, mas avisou que vai encomendar um levantamento sobre a contratação de parentes de parlamentares. Os técnicos vão encontrar pelo menos mais dois casos: o do primeiro-secretário do Senado, Efraim Morais (DEM-PB), e o do senador Mão Santa (PMDB-PI).

Morais tinha, até o início do mês, sete familiares em seus gabinetes, e seis parentes de seus aliados políticos. No dia 7, ele anunciou a demissão da filha Caroline Morais, estudante de jornalismo. Todos, segundo o primeiro-secretário, apesar da intimidade, com currículo para preencher a vaga.

O senador Mão Santa vai deixar de contar com os serviços da mulher, Adalgisa, personagem constante em seus divertidos discursos. Para o senador, a falta da esposa terá reflexo na produção de seus pronunciamentos. Em 2007, Mão Santa foi o parlamentar que mais falou na tribuna do Senado. ­

- Desde o início da minha vida pública trabalhamos juntos - lamentou. ­ Ela sempre foi eficiente e esforçada no trabalho.

Projetos A deliberação do Supremo poderia ter sido tomada antes pela Câmara ou pelo Senado. Nas duas Casas legislativas, projetos nos mesmos moldes da súmula do STF aguardavam um acordo de líderes para serem analisados em plenário. O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), comemorou a decisão dos ministros e afirmou que tentou incluir projetos sobre o tema na pauta de votação, mas, a idéia foi descartada pelos líderes. ­

- Algumas bancadas achavam que não dava para votar ­ justificou.

Os hábitos difundidos na Casa pautaram a resistência dos líderes para votar regras contra o nepotismo. O JB encontrou, nos últimos Boletins Administrativos da Câmara, 30 casos de nepotismo e nepotismo cruzado. Contactados por telefone, assessores dos gabinetes confirmaram a contratação dos parentes, sendo a maioria lotada nos escritórios estaduais. Alguns deputados informaram, por meio da assessoria, que vão acatar a resolução do STF.

Ontem, o deputado Sandro Matos (PR-RJ) exonerou Gilvandro Matos Pereira, irmão e assessor parlamentar, e Luciene Real Muniz Matos Pereira, mulher e assessora parlamentar. ­

- Acatarei todas as decisões do STF ­ disse. ­ Lamento que tenham feito mau uso das contratações de pessoas não qualificadas para cargos públicos, isso acaba prejudicando a quem realmente tem capacidade para exercer a função.

No Rio, além de Matos, o deputado Carlos Santana (PT-RJ) também tem parentes entre seus funcionários. Contratou a cunhada Rosiane Alves. Como na Câmara, há dois anos, ficou proibido a efetivação de parentes nos cargos de natureza especial (CNEs), os parentes viraram secretários parlamentares. Os salários variam entre R$ 700 e R$ 8 mil. O primeiro-secretário da Câmara, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), diz que a Casa vai se adequar às novas regras, mas ainda tem dúvidas de como será o sistema das demissões. O assunto deve ser discutido na próxima semana durante reunião da Mesa Diretora. ­

- Ainda vamos nos reunir e refletir sobre a decisão do STF ­ disse Serraglio. ­ Precisamos ainda verificar as interpretações da súmula para definirmos que medidas adotaremos.