Título: Às vésperas da sessão, cautela em vez de confronto
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 26/08/2008, País, p. A12

Em Roraima, o clima de tensão que culminou em confronto com feridos e presos há três meses foi substituído por uma cautelosa expectativa.

¿ A possibilidade de um conflito não é uma questão matemática. É emocional. O conflito é latente e vai estourar agora ou depois ¿ disse o líder dos arrozeiros e prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero. ¿ Sou legalista. Assinamos uma ata nos comprometendo a acatar a decisão do Supremo, qualquer que seja. Mas o caso fugiu da nossa alçada e a decisão vai influir na vida nacional ¿ afirmou.

Além do impacto sobre a vida econômica e social de Roraima, segundo o prefeito, a decisão do STF terá reflexos também em questões como a soberania do país e a definição do marco para a política envolvendo terras indígenas.

Preparado para qualquer cenário, o governo reforçou a segurança em Roraima com tropas da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança. Até amanhã devem se concentrar na região, especialmente na área do conflito, cerca de 700 homens, a maioria formada por federais. O Ministério da Justiça teme que a manutenção do decreto do presidente Lula prevendo a homologação em área contínua acabe provocando a reação dos plantadores de arroz e dos índios por eles controlados. Mas na hipótese de o STF fatiar a reserva, criando ilhas ocupadas por não-índios, a reação das etnias ligadas ao Conselho Indigenista de Roraima (CIR), apoiadas pela Igreja Católica e ONGs estrangeiras, pode ser ainda mais intensa.

No fim de semana, um grupo de cerca de 300 índios ligados ao CIR invadiu a sub-prefeitura de Surumu, um distrito de Pacaraima no coração da reserva, ocupou o Posto de Saúde e só na tarde de ontem deixou o local. Os manifestantes permaneceram em Surumu, concentrados no interior de um ginásio de esportes da prefeitura, onde devem permanecer em vigília até a decisão do STF.

Deslocada para garantir a ordem e evitar confronto, a Polícia Federal teme a reação dos índios ligados ao CIR caso o decreto do governo seja derrubado. Desde que a crise começou, os índios vêm ameaçando retirar à força e por conta própria funcionários e plantadores de arroz que estão nas sete fazendas ocupadas dentro da reserva. A Funai já gastou R$ 12 milhões indenizando proprietários que aceitaram a saída negociada e também aguarda com expectativa a decisão do STF. Uma decisão por ilhas pode provocar um refluxo das cerca de 100 famílias que já deixaram a área. (V. Q.)