Título: ONU prevê surpresa no julgamento
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Jornal do Brasil, 26/08/2008, País, p. A12

Relator do organismo internacional pede respeito à livre determinação dos povos indígenas. BRASÍLIA

Quatro meses depois de suspender a operação de retirada dos não-índios em Roraima, o Supremo Tribunal Federal (STF) decide nesta quarta-feira o destino da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol e da política de demarcação de reservas do governo Lula para todo o país. Caso derrube o decreto que homologou 1,7 milhão de hectares em área contínua a cerca de 20 mil índios de Roraima, o STF abrirá um precedente que pode permitir a revisão de outras 615 áreas ¿ um total de 109,6 milhões de hectares ou 13% do território nacional ¿ onde vivem atualmente entre 750 mil a 1 milhão de índios, divididos em 220 etnias, 27% delas na região Amazônica.

¿ O STF pode surpreender e apresentar uma solução que não tire tudo de cada lado. A mim não surpreenderia porque tenho confiança em tribunais independentes ¿ disse ontem em Brasília o novo relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os direitos dos povos indígenas, James Anaya, depois de uma visita de 12 dias pelo Mato Grosso do Sul, Amazonas e Roraima, onde dialogou com índios e lideranças na Raposa/Serra do Sol. Anaya afirmou que não percebeu clima beligerante na reserva, evitou entrar no mérito sobre o formato da área, mas pautou suas declarações ¿ a dois dias da decisão do STF ¿ por um pedido de respeito à livre determinação dos povos indígenas. Insistiu em lembrar que a questão da terra é o principal dilema indígena e frisou que em algumas regiões, como Roraima, os fazendeiros que disputam com os índios o mesmo espaço não têm título de propriedade, ao contrário de proprietários de boa fé que diz ter encontrado em Dourados (MS). Ele criticou organizações não-governamentais (ONGs) e agências estatais como Funai e Funasa, afirmando que o conceito básico desses segmentos é a tutela continuada e cobrou do governo a inclusão dos índios em programas como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e Bolsa Família.