Título: Brasileiros made in China
Autor: Rosa, Leda
Fonte: Jornal do Brasil, 31/08/2008, Economia, p. E3

Empresários do Brasil vão ao outro lado do mundo disputar com chineses o mercado verde-amarelo.

SÃO PAULO

A conjuntura macroeconômica provoca a migração de empresas brasileiras para a China. Indústrias nacionais vão para o outro lado do mundo seduzidas pelas vantagens fiscais, mão-de-obra barata e do ambiente facilitador dos negócios. De lá, aproveitam o mercado daqui para exportam para o próprio Brasil. O que parece um contra-senso, apresenta-se como lucrativo. A rota da China tem sido tão vantajosa que boa parte do empresariado migrante decide, em menos de dois anos, fechar a planta no Brasil e concentrar o investimento, a produção e a geração de empregos na China.

Na contramão da exportação de divisas no comércio exterior, especialistas apontam que os empresários brasileiros instalados aqui perdem a oportunidade de faturar US$ 218 bilhões em 147 itens da lista de importações da China nos quais o Brasil é competitivo. Nas próximas duas páginas, especialistas discutem, em artigos exclusivos para o JB, os entraves do comércio brasileiro.

A maior parte do êxodo das empresas brasileiras rumo à China é do setor dos bens de consumo. A movimentação começou em 2005. A maior parte dos novos endereços está no sul, região de Xangai, principal pólo industrial, sede das bolsas de valores e berço da primavera econômica do país.

Nesta área do litoral chinês, os empresários brasileiros montam escritório de representação e buscam no mercado empresas que fabriquem os itens com empregados e infra-estrutura chineses. A venda se realiza entre a empresa chinesa e a brasileira, com intermediação do escritório de representação. O produto chega aqui com o know-how e a marca da empresa brasileira, que pode ter mais de um fornecedor em solo chinês.

¿ As vantagens são tão grandes que muitas empresas brasileiras deixam de fabricar aqui. O volume importado chega a 100%. É processo que não leva mais de dois anos. São decisões de mercado, de modo geral agilíssimas ¿ explica Durval Noronha, sócio sênior do escritório Noronha Advogados, o primeiro da América Latina a operar na China.

"Além de causar problemas nas exportações, a taxa de câmbio praticada tem estimulado empresas brasileiras a adquirir ou instalar linhas de produção industrial no exterior para fornecer a mercados antes atendidos pela empresa no Brasil, assim como para exportar para o próprio Brasil", escreve José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), num dos artigos inéditos.

¿ O número de empresas brasileiras na China não é significativo. Hoje são menos de 30 e plantas produtivas, menos de 10 ¿ calcula Rodrigo Maciel, secretário-executivo do Conselho empresarial Brasil-China, organismo sem fins lucrativos de interlocução com os governos para desenvolvimento das relações entre os dois países.

Mesmo com a baixa ocorrência, a migração da planta fabril de empresas brasileiras adensa a discussão sobre os rumos do Brasil no comércio exterior, na qual a valorização do real têm grande influência.

¿ São a tríade demoníaca ¿ diz Noronha, referindo-se à sobrevalorização do dólar (calculada em 35%, contra uma subvalorização de 25% do iuan), às taxas de juros reais (em torno de 7% contra 2% negativos da China) e à carga tributária (70 impostos que somam 40% do PIB contra oito chineses, que equivalem a 20% do PIB).