Título: No interior, a farra da gastança
Autor: Jardim, Idelina; Máiran, Paula
Fonte: Jornal do Brasil, 07/09/2008, Tema do Dia, p. A2

MP investiga o uso de Oscips, espécie de ONGs, para desvio de dinheiro público. Trajano de Moraes e Aperibé estão entre municípios suspeitos.

Profissional de informática, Carlos Eduardo Magacho, de 28 anos, prestou e ainda presta serviços como pessoa física a diferentes Oscips ­ Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público ­ no interior do Estado. Dessa forma, segundo o próprio Magacho, ele já atuou nos municípios de Aperibé, Santo Antônio de Pádua, São Sebastião do Alto e Macaé. Em 2005, resolveu, com outros colegas, montar a sua própria Oscip, o Intesp - Instituto de Apoio à Tecnologia, Educação, Saúde, Promoção Social, Meio Ambiente e Cultura. Neste ano eleitoral, conquistou o seu primeiro cliente, a prefeitura de Trajano de Moraes, também no Noroeste fluminense. Fechou com o município, somente entre março e abril, oito termos de parceria para a prestação de serviços de saúde, assistência social e meio ambiente, em valor total de cerca de R$ 3 milhões, o equivalente a mais de 10% do orçamento deste ano para o município rural de pouco menos de 10 mil habitantes. A história de Magacho não representa caso isolado. Criadas por lei federal em 1999, as Oscips estão na mira do Ministério Público Estadual, que investiga a suspeita de haver uma conexão entre as diversas entidades que atuam no Rio, por meio de contratos milionários com prefeituras. Observa-se a proliferação pelo interior do Estado de entidades detentoras dessa sigla ­ Oscip é título concedido pelo Ministério da Justiça que as habilita a formar parcerias e convênios com o poder público. No caso do Intesp, há indícios de que a Oscip atue como mera agências de empregos, na contratação de mão-de-obra para a prefeitura de Trajano, sem realização de concurso público e por meio de indicações políticas, especialmente em um ano eleitoral. Sob a suspeita de irregularidades, os contratos, todos de validade de nove meses, tornaram-se objetos de apuração não só no âmbito do Ministério Público, mas também na Justiça Eleitoral e ainda na Secretaria Nacional de Segurança, após recebimento de denúncia, na semana passada, pelo secretário Romeu Tuma Júnior. No Ministério da Justiça, a Oscip, com sede no município vizinho de Santo Antônio de Pádua, consta em situação irregular, sem a devida prestação de contas de 2007. Magacho contesta: ­ Enviamos a nossa prestação de contas de 2007 dentro do prazo. Deve estar ocorrendo algum problema no Ministério. Atuamos dentro de total legalidade e um dos nossos diferenciais é, inclusive, a contratação de pessoal com carteira assinada e todos os direitos garantidos ­ afirmou o presidente do Intesp.

Repasses

Segundo a própria prefeitura, até 15 de agosto, o Intesp chegou a receber cerca de R$ 1 milhão dos cofres municipais. Em meados de agosto, porém, a juíza da Vara Única de Trajano de Moraes, Maria Clacyr Schuman, determinou o bloqueio dos repasses para a Oscip, enquanto o Ministério Público iniciou apuração de ilegalidade nos termos de parceria, por contratação de mão-de-obra de forma indevida. Em despacho de 23 de julho, o desembargador Motta Moraes, vice presidente do TRE, enviou ao Ministério Público Eleitoral representação sobre suposto uso político das contratações para conquista de votos pelo prefeito João Luiz Gomes Viana, candidato à reeleição. A denúncia também foi enviada à Justiça comum para apuração de suspeita de má gestão de recursos públicos e de improbidade administrativa.