Título: Empresas novatas na Bolsa sofrem desvalorização
Autor: Pinheiro, Vinícius
Fonte: Jornal do Brasil, 08/09/2008, Economia, p. A18

Crise reforça a percepção de que os investidores pagaram caro pelas ações.

SÃO PAULO

Os efeitos da crise financeira internacional e a da falta de liquidez no mercado têm sido ainda mais intensos nas ações de empresas novatas na Bolsa. De acordo com dados da BM&F Bovespa, oito em cada 10 companhias que abriram o capital desde janeiro do ano passado apresentam uma cotação inferior em relação ao valor obtido na oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês). Das 66 companhias que vieram a mercado no período, 54 registraram desempenho inferior ao do Ibovespa, principal índice do mercado acionário brasileiro.

A queda dos papéis reforçou a percepção de que as companhias podem ter sido sobreavaliadas. Um estudo realizado pelo núcleo de real estate da Escola Politécnica da USP indica que, pelo menos no caso dos IPOs do setor de construção civil, o preço pago pelos investidores superestimou as projeções de resultados futuros das companhias.

¿ Das 15 empresas analisadas, nove apresentaram taxa de retorno histórico abaixo de 8% ao ano, esperado em projetos de perfil conservador e, em quatro dessas empresas, o retorno foi menor do que 4% ao ano ¿ explica a engenheira Carolina Gregório, uma das autoras do estudo.

Para a pesquisadora, os investidores consideraram cenários extremamente otimistas no momento de avaliar as companhias.

¿ Nem sempre ter mais dinheiro em caixa se traduz em resultados imediatos ¿ diz.

Construção civil

Desta forma, as construtoras, de um modo geral, não deram o retorno esperado em relação ao preço da oferta de ações, segundo Carolina, que apresentou o estudo na semana passada, no 8º Seminário Internacional da Sociedade Latino-americana de Real Estate, em São Paulo. Como empresas de outros setores também vieram a mercado com histórias semelhantes, ou seja, de crescimento acelerado nos lucros por conta da expectativa de expansão da economia brasileira, a explicação para a queda das ações pode ser a mesma das construtoras e incorporadoras.

Na análise de especialistas, o preço dos IPOs refletiu as condições de mercado da época, marcado pela liquidez farta e a baixa aversão ao risco. Agora, com o agravamento da crise internacional, os investidores exigem uma taxa de desconto maior para ficar com os papéis, o que pressiona para baixo o valor de mercado das empresas.

O diretor de relações com empresas da BM&F Bovespa, João Batista Fraga, credita as perdas mais acentuadas das novatas à grande participação de estrangeiros nos IPOs:

¿ Com a crise, muitos desses investidores reorganizaram seus portfólios e venderam as ações.

Fraga discorda da possibilidade de que as empresas tenham sido avaliadas acima do preço justo.

¿ Quase 94% do volume de ações nas ofertas ficou nas mãos de investidores institucionais, acostumados a avaliar esse tipo de operação.

Ele também não considera que houve euforia exagerada no número de IPOs realizados no ano passado. O executivo acha que a queda das ações das novatas da Bolsa não seja vista de forma generalizada, ainda que, no momento, o mercado pareça fazer um único julgamento sobre as companhias.

¿ Toda generalização é pouco proveitosa ¿ considera.

O chefe da mesa de operações da HSBC Corretora, José Augusto Miranda, também considera que a saída dos estrangeiros foi a principal razão da queda mais forte das ações estreantes no mercado em relação ao Ibovespa.

¿ Antes da crise lá fora, a fotografia desses papéis era bem melhor ¿ lembra. Ele avalia que algumas empresas podem ter saído a um valor mais elevado, mas diz que a oscilação dos papéis foi mais influenciada pela conjuntura de mercado.

Em momentos de turbulência nos mercados, ações de empresas com menor histórico de negociação ficam mais fragilizadas, de acordo com o profissional do HSBC.

¿ Investidor que pretende se posicionar no mercado de ações neste momento de incerteza dificilmente vai escolher uma das novatas.