O GLOBO, n 32.321, 02/02/2022. Política, p. 4

Temer volta à cena em crise entre Bol­so­naro e Moraes

Jussara Soares e Gustavo Schmitt


Ex-presidente foi chamado pelo Planalto após seu sucessor faltar a depoimento. ‘Dessa vez, só transmiti a mensagem’, afirma

Após atuar para apaziguar um conflito entre o presidente Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal (STF) no último 7 de Setembro, o ex-presidente Michel Temer foi chamado mais uma vez para intermediar um impasse entre o mandatário e o ministro Alexandre de Moraes.

Temer foi procurado semana passada por ministros do governo que demonstraram preocupação com os desdobramentos de uma possível crise institucional após Bolsonaro não comparecer, na sexta-feira, ao depoimento marcado por Moraes no inquérito que investiga vazamento de dados sigilosos.

Dessa vez, no entanto, o ex-presidente diz que não conversou com Bolsonaro. Ao GLOBO, Temer afirmou que se limitou a transmitir a Moraes que o Palácio do Planalto não queria atritos.

— Alguns do governo me ligaram pautados por aquele episódio anterior (7 de Setembro), dizendo: “O senhor precisa entrar nisso pra amenizar essa situação toda aí”. Eu disse: “Não sei o que fazer. De toda maneira, se eu puder colaborar, eu colaborarei como sempre fiz porque acho muito desagradável esse conflito de poderes”. Foi só isso —disse.

O ex-presidente afirmou que não foi procurado para dar “conselhos” aos ministros e que teve apenas uma conversa “genérica” e “ligeira”.

— O presidente não falou comigo. Não fiz mais que isso: eu transmiti apenas uma mensagem ao ministro Alexandre que havia um pleito de uma certa harmonia e ficou nisso —disse Temer.

De acordo com pessoas próximas, o ex-presidente tratou com o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Bruno Bianco, para encontrar uma saída para o incidente. A AGU recorreu ao plenário do Supremo argumentando que, por ser investigado no inquérito, Bolsonaro não era obrigado a comparecer ao depoimento de sexta-feira.

Questionado se atuou como um gerenciador de crise, Temer respondeu que a “ideia era essa”:

— Não virou crise. Está mais ou menos sob controle.

Como mostrou o GLOBO, auxiliares de Bolsonaro o aconselharam a evitar novos atritos com o STF e com Moraes. A avaliação de ministros é de que não haveria unanimidade entre os demais integrantes da Corte sobre a decisão a respeito da obrigatoriedade de depoimento do presidente. Se o presidente resolvesse acirrar os ânimos, porém, o STF poderia defender Moraes.

A percepção no Planalto é que a estratégia deu certo, por ora. Integrantes do governo dizem que não há intenção de nenhum lado de escalar a crise agora.