Título: A imutável caixa-preta dos juros
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 20/02/2005, Economia, p. A21
Polêmica sobre aperto monetário incentiva especulações sobre mudanças na diretoria do BC, mas troca-troca promete ser inócuo
O sexto aumento consecutivo da taxa básica (Selic), para 18,75% ao ano, esta semana, voltou a mobilizar representantes do setor produtivo. A principal cobrança está relacionada ao excesso de conservadorismo do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que persegue a ambiciosa meta de 5,1% de inflação este ano. Especialistas apontam a persistente alta dos preços como justificativa para as decisões do BC, mas divergem em relação à dose do remédio amargo imposto nos últimos meses. A maior preocupação é com relação à capacidade da economia de manter o ritmo de crescimento.
Operadores do mercado financeiro aguardam com expectativa mudanças na cúpula do BC, devido à insatisfação de pelo menos três de seus integrantes: os diretores de Política Econômica, Afonso Bevilacqua; de Assuntos Internacionais, Alexandre Schwartsman; e de Estudos Especiais, Eduardo Loyo.
Schwartsman teve suas funções esvaziadas depois que a emissão de títulos públicos no exterior passou para as mãos do Tesouro Nacional. Já Bevilacqua - considerado de temperamento explosivo e redator oficial das atas do Copom - e Loyo teriam sido seduzidos por propostas da iniciativa privada.
Mas quem espera mudanças na condução da política monetária deve pôr as barbas de molho. Especialistas alertam que o iminente troca-troca não deve afetar a essência conservadora do Copom, chamado em tom jocoso de caixa-preta pelos críticos da política de juros elevados.
Em 1999, o país adotou o sistema de metas de inflação como balizador da política monetária que determina os juros básicos. A instituição eleva ou reduz a Selic de acordo com o objetivo traçado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN, formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC).
A definição de uma política de arrocho monetário, como a que está em curso desde setembro - quando a Selic estava em 16% ao ano -, independe por completo, segundo o economista-chefe de uma grande gestora de fundos, de quem ocupa um dos oito cargos na diretoria do BC e, conseqüentemente, vota nas reuniões do Copom.
O mercado enxerga que as decisões do comitê estão cada vez mais institucionalizadas, afastadas da pressão política. Além disso, persiste entre analistas a percepção de que a economia tem crescido de forma consistente e a inflação se mostra mais resistente, com o núcleo bem acima do centro da meta, o que justificaria a atual trajetória da Selic.
O executivo acredita que atualmente o grupo ''mais acadêmico'', formado por Bevilaqua, Schwartsman, Loyo e o diretor de Política Monetária, Rodrigo Azevedo, componha um núcleo técnico que baliza as decisões do Copom. O economista, no entanto, ressalta que isso não significa discordância dos demais integrantes.
- Não vejo cisões no comitê. Acontecem divergências pontuais sobre a dimensão da alta ou do corte, mas nunca quanto à sinalização. Hoje, temos acadêmicos nos lugares corretos e burocratas nas diretorias adequadas - garante.
O diretor de uma corretora concorda que nem mesmo uma dança das cadeiras mudaria as convicções do Copom.
- O Ilan (Goldfajn, ex-diretor de Política Econômica), o Candiota (Luiz Augusto, ex-diretor de Política Monetária) e o Figueiredo (Luiz Fernando, também ex-diretor de Política Monetária) saíram e tudo continuou a mesma coisa. É normal pessoas deixarem o cargo. Mas com certeza, outros com perfil semelhante seriam chamados em caso de trocas - pondera.