O GLOBO, n 32.317, 29/01/2022. Mundo, p. 20

Presidente da Ucrânia pede que não se difunda ‘pânico’



Sem minimizar ameaça russa, Zelensky afirma que Moscou quer intimidar seu país e que guerra não é iminente ou inevitável

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, pediu enfaticamente ontem para que os EUA, as outras potências ocidentais e a mídia internacional evitem exagerar em suas descrições dos riscos de uma invasão russa ao seu país.

— Não precisamos desse pânico —disse Zelensky. — Acho que tem que haver uma preparação militar silenciosa e uma diplomacia silenciosa. O pedido aconteceu em uma entrevista coletiva um dia após um telefonema entre o presidente ucraniano e o americano, Joe Biden, que provocou grande especulação na imprensa dos EUA.

Citando um alto funcionário do governo ucraniano, muitos veículos informaram que Biden teria dito a Zelensky que uma invasão dos militares russos “era certa” e ocorreria assim que o solo da região congelasse. O site Axios publicou que fontes confirmaram que os dois presidentes teriam discordado sobre a iminência da ameaça russa, com o ucraniano afirmando ter informações de inteligência que minimizavam o risco.

Ontem, Zelensky disse que a Rússia quer intimidar a Ucrânia e exerce um “sadismo” e “um cinismo contundente”, mas reforçou a impressão de que não considera um ataque algo certo. O presidente ucraniano disse que a situação de segurança nos limites de seu país —em cujas fronteiras há dezenas de milhares de soldados russos posicionados — não se diferencia muito da mesma época no ano passado e, embora perigosa, não significa que uma guerra seja iminente ou inevitável.

— A probabilidade de ataque existe, não desapareceu e não foi menos grave em 2021 —disse. —Não é como se estivéssemos agindo como se fosse o nível mais alto de ameaça. Não vemos nenhum acirramento maior do que já existia.

PREOCUPADO COM ECONOMIA

O presidente não divergiu abertamente de Biden sobre a gravidade da ameaça russa, mas disse diferir no tom em que os comentários públicos sobre a situação devem ser feitos, inclusive para atenuar os efeitos sobre a economia ucraniana. Zelensky criticou os relatos “da mídia internacional e mesmo de chefes de Estado respeitados” que sugerem que “já ocorre uma guerra”.

— Quanto esse pânico vai custar ao nosso país? — perguntou. —O maior risco para a Ucrânia é a desestabilização da situação interna.

Zelensky discordou das decisões dos EUA e do Reino Unido de retirar funcionários diplomáticos não essenciais da Ucrânia, o que ele indicou como uma ação indevidamente alarmante.

Ele observou que a Grécia manteve aberto seu consulado em Mariupol, perto da linha de frente com separatistas apoiados pelos russos.

—Você pode ouvir canhões disparando. Os gregos não tiraram ninguém. Os capitães não devem deixar o navio. Acho que isso daqui não é o Titanic —disse. 

Vários representantes ocidentais disseram nesta semana esperar um ataque russo a partir de meados de fevereiro, sem contudo citar a escala ou o objetivo da ação. Ontem, o Pentágono disse que, nas 24 horas anteriores, mais forças russas chegaram à região.