O GLOBO, n 32.322, 03/02/2022. Economia, p. 13
INSS acaba com prova de vida de aposentados e pensionistas
Daniel Gullino, Letycia Cardoso e Martha Imenes
Governo cruzará dados de registros para atualizar cadastros. Bloqueio de pagamento está suspenso até o fim do ano
O governo federal anunciou ontem que aposentados, pensionistas e outras pessoas que recebem benefícios do INSS não terão mais de fazer a prova de vida presencialmente. A verificação será feita pelo próprio governo, que consultará bases de dados públicas e privadas para saber se a pessoa continua viva.
O anúncio foi feito durante cerimônia no Palácio do Planalto, na qual o presidente Jair Bolsonaro assinou uma portaria com as novas regras. A prova de vida foi instituída em 2011 para evitar fraudes. De acordo com o governo, cerca de 36 milhões de pessoas tinham de provar que estavam vivas todos os anos.
—A partir de agora, a obrigação de fazer a prova de vida é nossa, do INSS. Como faremos? Com todas as bases de todos os órgãos do governo — disse o presidente do INSS, José Carlos Oliveira, na cerimônia.
O presidente do INSS citou, entre as bases de dados que serão consultadas, a renovação da carteira de identidade ou do passaporte, o registro de votação e a transferência de imóvel ou veículo. O Ministério do Trabalho informou que também serão consultados registros de vacinação e de consultas ao SUS, emissão de carteira de motorista e aquisição ou renovação de empréstimo consignado:
— Faremos a busca das bases, tanto no governo federal, estadual e municipal, e também em entidades privadas.
ÔNUS DO ESTADO
De acordo com o ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, as bases de dados privadas serão de bancos, redes varejistas e universidades. Essa verificação ocorrerá a cada dez meses:
— O INSS tem a obrigação, a partir de hoje, de correr bases de dados públicas e privadas para poder encontrar a prova de que a pessoa está viva.
O INSS tem até 31 de dezembro para implementar as mudanças a fim de cumprir a portaria. Até lá, o bloqueio de pagamento pela falta de prova de vida está suspenso.
Caso o governo não encontre um “movimento” do cidadão, uma equipe irá até a casa do beneficiário. Essa operação será feita por meio de parcerias, uma delas com os Correios, segundo Oliveira:
— Se não encontrarmos um movimento do cidadão em uma das bases, mesmo assim o cidadão não vai precisar sair de casa para fazer a prova de vida. O INSS proverá meios, com parcerias que fará, para que a entidade parceira vá à residência e faça a captura biométrica na porta do segurado.
A coordenadora-adjunta do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Fernanda Angeli Veloso, lembra que a dinâmica em relação ao estado muda:
— É uma transferência de responsabilidade do cidadão para o governo.
EXIGÊNCIA DESNECESSÁRIA
Segundo Fernanda, assim como a criação da central 135 diminuiu as filas nas agências, a expectativa é que a desobrigação da prova de vida otimize os serviços do INSS.
— Os servidores vão poder gastar mais tempo com concessão e revisão de benefícios, por exemplo, dando andamento a uma série de processos que estão pendentes.
Átila Abella, cofundador da lawtech Previdenciarista, considerava a exigência desnecessária diante da digitalização:
— Acho que é positiva, na medida em que desburocratiza um procedimento que, ao meu ver, já seria desnecessário. Se o INSS tem acesso às informações do Sistema Informatizado de Controle de Óbitos, a cessação e suspensão de benefícios por óbito deveria ser automática, sem necessidade de prova de vida.
Entre as mudanças, deve ser implementada a prova de vida on-line para quem ainda precisar fazê-la. Para Fernanda, do IBPD, isso é um problema:
— A maioria dos beneficiários é de pessoas com pouca instrução e que, muitas vezes, não têm acesso à internet. Essa população pobre pode entrar num limbo.
Bolsonaro elogiou o fim da exigência, que considerava uma “desumanidade”.
— Pegar uma pessoa dessas, botar em uma van, em um carro, táxi, para fazer uma prova de vida é um ato de desumanidade.
Tentativa de evitar fraudes
> A prova de vida do INSS foi criada em março de 2011, para reduzir fraudes no sistema previdenciário. Como os sistemas não eram totalmente informatizados, a atualização de dados era difícil e lenta, facilitando a ação dos fraudadores.
> A coordenadora-adjunta do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP),Fernanda Angeli Veloso,lembra que a informação de um óbito podia levar meses ou até anos para chegar ao INSS.Hoje,a tecnologia permite o acesso rápido a informações, tornando sem sentido a prova de vida.
> — Se a pessoa vinha a óbito no interior da Bahia, demorava meses, ou até anos, para que essa informação chegasse ao INSS.
> Segundo ela,mais de 36 milhões de pessoas tinham de ir ao banco provar que estavam vivas. Agora,isso é exceção.