O GLOBO, n 32.323, 04/02/2022. Opinião, p. 2

Banco Central persiste na batalha contra a inflação



O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) confirmou na quarta-feira que a luta contra a inflação segue firme. Como já era esperado, a taxa básica de juros da economia, a Selic, saiu de 9,25% para 10,75% ao ano. Foi a oitava elevação consecutiva em pouco mais de um ano. Desde julho de 2017, o principal instrumento da política monetária para alcançar a estabilidade de preços não chegava aos dois dígitos. Embora nunca comemorada por contrair a atividade econômica, a alta da Selic era, sem dúvida, necessária. Novos aumentos são esperados até que o BC consiga ancorar as expectativas de altas de preços às metas de inflação do país. É uma grande lástima que o presidente Jair Bolsonaro esteja tornando essa missão mais difícil.

Como todos sentiram em 2021 quando foram às compras, os valores cobrados por produtos e serviços dispararam. O ano terminou com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 10,06%, quase o dobro do teto da meta. De acordo com o regime monetário adotado desde 1999, o BC se compromete a garantir uma meta preestabelecida que conta com um intervalo de tolerância. O objetivo central de 2021 era de um IPCA de 3,75%, podendo, no máximo, chegar a 5,25%. Ficou longe disso.

Foi justamente para voltar a controlar a alta de preços que o BC começou a escalada dos juros. A meta para este ano é de um IPCA de 3,50% e um teto de 5%. A mediana das projeções dos analistas ouvidos pelo boletim Focus, do próprio BC, ainda está acima, em 5,38%. O mesmo acontece com a meta para 2023. O objetivo é um IPCA de 3,25%. O mercado estima 3,5%.

Essa é a foto hoje. Mas, no radar do BC, há riscos que podem se tornar realidade mais para frente e elevar as previsões dos analistas econômicos. Entre eles, eventuais pressões negativas nos mercados emergentes provocadas pela esperada alta dos juros americanos e os desdobramentos da pandemia e suas consequências nas já enroladas cadeias globais de produção. Quem pagou e está esperando para receber um carro novo sabe bem do problema nos suprimentos de peças e dos preços em patamares altos.

É por isso que o comunicado após a reunião desta semana fala em “próximos passos”. Novas elevações dos juros são esperadas, talvez num ritmo inferior ao das últimas. O BC faz bem ao reconhecer que podem surgir boas notícias para quem está preocupado com a inflação. Uma delas seria a queda dos preços das commodities, as matérias-primas com cotações internacionais, como soja e minério de ferro. Mas os diretores do BC, um órgão independente, também sabem que estão lutando sozinhos.

O comunicado foi direto ao ponto. “Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que a incerteza em relação ao arcabouço fiscal segue mantendo elevado o risco de desancoragem das expectativas de inflação”. Traduzindo: o presidente Jair Bolsonaro, obcecado em ter chances nas eleições deste ano, só pensa em gastar e gastar, mesmo que isso represente a elevação da inflação com o aquecimento da demanda por produtos e serviços.