O Estado de S. Paulo, n. 48066, 24/05/2025. Política, p. A8

Moraes trava bate-boca com Aldo Rebelo e o ameaça com prisão
Levy Teles

 

 

Ex-ministro da Defesa testemunhou em favor do ex-comandante da Marinha Almir Garnier. Alexandre de Moraes repudiou interpretação sobre fala de Garnier e Rebelo disse que não admitia “censura”.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ameaçou ontem prender o ex-ministro Aldo Rebelo depois de um bate-boca entre os dois, durante depoimento do ex-titular da Defesa na ação penal do golpe. Rebelo, que foi ouvido como testemunha de defesa do ex-comandante da Marinha Almir Garnier, tinha dito que a frase do almirante – sobre “deixar à disposição” do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) as tropas em caso de uma tentativa de golpe – “não pode ser tomada literalmente”.

“É preciso levar em conta que, na língua portuguesa, usamos a força da expressão. A força da expressão nunca pode ser tomada literalmente. Quando alguém diz ‘estou frito’ não quer dizer que está numa frigideira”, afirmou Rebelo. O ex-ministro, então, foi repreendido por Moraes.

“O senhor estava na reunião quando o almirante Garnier falou essa expressão?”, perguntou o ministro. Rebelo respondeu negativamente. “Então, o senhor não tem condição de avaliar a língua portuguesa naquele momento. Atenha-se aos fatos”, disse Moraes.

“A minha apreciação da língua portuguesa é minha e não admito censura”, retrucou Rebelo. Moraes então ameaçou prender o ex-ministro. “Se o senhor não se comportar, o senhor vai ser preso por desacato”, afirmou o magistrado.

Houve ainda mais entreveros durante a audiência. A defesa de Garnier, feita pelo advogado Demóstenes Torres, perguntou se a Marinha teria condições para dar um golpe de Estado. Moraes, então, fez uma advertência. “Aldo Rebelo é um historiador, é uma pessoa inteligente. Ele sabe que em 64 não foi ouvida toda a cadeia de comando para se dar o golpe militar. Não podemos fazer conjecturas fora da realidade. Não pode perguntar algo que ele não tem conhecimento técnico. Ele é um civil, que foi ministro da Defesa, mas é um civil”, afirmou Moraes.

MOURÃO. O ex-vice-presidente da República e senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) disse, em seu depoimento também ontem ao Supremo, que desconhece a tentativa de golpe e culpou o governo de Luiz Inácio Lula da Silva pela desordem em Brasília em 8 de janeiro de 2023.

Mourão é testemunha do general Augusto Heleno, do exministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, do ex-presidente Jair Bolsonaro e do general Walter Braga Netto no processo em que o ex-chefe do Executivo é acusado de tentativa de golpe de Estado.

Na audiência, Mourão disse que não participou de nenhuma reunião que tenha envolvido alguma intentona golpista e afirmou não ter falado sobre o Peru, que vivia uma tentativa de autogolpe, em 2022. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, perguntou a Mourão se ele achava que Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator, era “mentiroso”, já que o tenentecoronel também tinha falado sobre a conversa. “Não, não posso dizer que ele era mentiroso, até porque não tive acesso ao que ele disse”, respondeu o senador.

O diálogo em questão, segundo as investigações, foi entre tenente-coronel do Exército Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, alvo da Operação Tempus Veritatis, e Mauro Cid. Cavaliere encaminhou para Mauro Cid quatro prints de uma conversa com o interlocutor de nome Riva.

Nas mensagens, Riva encaminha o que seriam informações de uma reunião entre Bolsonaro e o ex-vice-presidente Hamilton Mourão e outros generais. Riva afirma que Mourão negociou com outros generais a saída do Jair Bolsonaro, chamado de “01”.

Ele foi responsável pelo último discurso da gestão Bolsonaro, quando fez um pronunciamento em rede nacional no dia 31 de dezembro de 2022 e foi vaiado por bolsonaristas e chamado de “traidor” no acampamento no Quartel-General do Exército.

DISCURSO. Nesse discurso, Mourão, presidente em exercício, pediu que bolsonaristas lutassem “pela preservação da democracia” e que voltassem “à normalidade”. Sem mencionar nomes, Mourão destacou o “silêncio” de “lideranças” que afetou a imagem das Forças Armadas. •