O GLOBO, n 32.326, 07/02/2022. Mundo, p. 20

Em encontro com Xi, Fernández adere à nova Rota da Seda

André Duchiade


Com entrada da Argentina,só Brasil,Colômbia e Paraguai estão fora do programa de infraestrutura chinês na América do Sul

A Argentina e a China aprofundaram ontem sua cooperação estratégica, com a assinatura de um memorando de entendimento para a adesão argentina à Iniciativa Cinturão e Rota, plataforma para investimentos chineses em ferrovias, portos e rodovias em todo o mundo conhecida como “a nova Rota da Seda”.

O anúncio aconteceu após uma reunião de 40 minutos em Pequim entre os presidentes Xi Jinping e Alberto Fernández, às margens da Olimpíada de Inverno. “Tive um encontro cordial, amigável e frutífero com Xi Jinping. Concordamos em incorporar a Argentina ao Cinturão e à Rota da Seda”, disse Fernández em uma rede social após a reunião. “É uma excelente notícia. Nosso país obterá mais de US$ 23 bilhões [R$ 126 bilhões] de investimentos chineses para obras e projetos.”

De acordo com o memorando de entendimento, de 18 páginas, há projetos de investimento de US$ 9,7 bilhões em um conjunto de obras de infraestrutura relevantes para o setor de energia, a rede de águas e esgotos, os transportes e a construção de habitações. O governo da Argentina espera outros US$ 14 bilhões para 10 projetos de infraestrutura. Não está especificado o quanto dos aportes será por meio de investimentos e o quanto será por financiamento

A Iniciativa Cinturão e Rota é a maior aposta da China para expandir a sua influência econômica globalmente. Nela, bancos e empresas chinesas buscam financiar e construir estradas, usinas de energia, portos, ferrovias e redes 5G em todo o mundo.

É difícil determinar quais iniciativas integram a nova Rota da Seda, porém, porque há diferentes níveis de participação. Segundo o centro de estudos americano Council on Foreign Relations (CFR), 140 países participam da iniciativa. Na América do Sul, agora apenas Brasil, Colômbia e Paraguai não estão integrados formalmente a ela, de acordo com o CFR. A iniciativa enfrenta oposição dos EUA, que veem no projeto a tentativa de seu rival global de aumentar a sua influência e impor tecnologias próprias, como no 5G.

BALANÇO COM EUA

A Argentina avaliava há algum tempo a conveniência de aderir ao projeto e finalmente concordou agora. No ano passado, a China passou a ser o maior exportador para a Argentina, lugar antes ocupado pelo Brasil.

A visita de Fernández ocorre no marco do 50º aniversário do estabelecimento das relações diplomáticas entre Pequim e Buenos Aires e depois de o mandatário argentino ter visitado Moscou, onde se reuniu com Vladimir Putin na sexta-feira. Fernández pediu a Putin e a Xi para o seu país ingressar no Brics, fórum do qual hoje Brasil, Índia e África do Sul fazem parte, além de Rússia e China.

No Kremlin, Fernández, aparentemente sem saber que era ouvido por jornalistas, disse que a Argentina busca se libertar da dependência do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos EUA. Essa declaração ocorreu uma semana após a Casa Rosada chegar a um princípio de acordo com o Fundo para renegociar o pagamento da dívida de US$ 44 bilhões com o organismo, no qual precisa do apoio político do governo americano. A preocupação gerada pela declaração foi tamanha que o embaixador argentino em Washington, Jorge Argüello, foi chamado a Buenos Aires para haver alinhamento no posicionamento do país.

O comunicado divulgado após o encontro entre Xi e Fernández diz que ambos se comprometeram “a fortalecer a cooperação em swap (troca) de moedas para incentivar um maior uso de moedas nacionais no comércio e investimento, a fim de reduzir custos e o risco cambial”.

No comunicado, a Argentina reiterou seu apoio à soberania chinesa sobre Taiwan, enquanto Pequim apoiou a reivindicação argentina de soberania sobre as Malvinas. “O lado chinês reiterou seu apoio às demandas pelo pleno exercício da soberania da Argentina na questão das Ilhas Malvinas”, diz o texto.