O Estado de S. Paulo, n. 48069, 27/05/2025. Política, p. A8
Governo prepara PL de regulação de redes ainda para este semestre
Juliano Galisi
Gabriel de Sousa
Gabriel Hirabahasi
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode enviar ao Congresso, ainda neste semestre, uma proposta para a regulação de plataformas digitais. Os ministérios que participaram da elaboração de dois projetos avaliam o melhor momento político para apresentar os textos ao Legislativo, enquanto Lula tem ampliado a pressão sobre o tema diante da resistência dos parlamentares.
Em mais um sinal de que o governo tem pressa no regramento sobre as plataformas, a Advocacia-Geral da União (AGU) enviou ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF) um requerimento de urgência pedindo que a Corte imponha uma decisão célere sobre o Marco Civil da Internet.
Na Câmara dos Deputados, esse debate está congelado desde abril de 2023. O chamado Projeto de Lei das Fake News estava pronto para ir a voto em plenário, mas, alvo de polêmicas e sob oposição de grandes empresas do setor, como a Meta, acabou retirado da pauta.
No fim de semana, Lula deixou claro que pretende retomar as tratativas para a regulamentação das redes e plataformas digitais. “É preciso discutir com o Congresso a necessidade de regular redes sociais”, disse ele durante o lançamento do Programa Solo Vivo, em Campo Verde (MT). “Temos que regular o uso dessas empresas. Não é possível que tudo tem controle neste país, menos as empresas de aplicativos.”
Como mostrou o Estadão, o governo federal trabalha na elaboração de dois textos, um via Ministério da Fazenda, outro por meio do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
CONSUMIDOR. A proposta da Justiça foi preparada pela Secretaria de Políticas Digitais e estabelece deveres aos fornecedores de serviços nas redes. As exigências vão ao encontro das normas previstas pelo Código de Defesa do Consumidor, como a instituição de um Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) e de um canal de denúncias. Além disso, estão previstas garantias de mais transparência ao usuário quanto ao uso de seus dados e à identidade dos anunciantes.
O projeto mira sobretudo a proteção à criança e ao adolescente, fator que, na avaliação do governo federal, pode viabilizar um consenso entre base e oposição. O texto exige das empresas a remoção de conteúdo que constitua crime grave, como exploração sexual infantil, terrorismo e incitação ao suicídio e à automutilação. A retirada desse conteúdo será proativa, ou seja, de iniciativa das empresas. Em outros casos, como publicidade enganosa ou abusiva, a remoção será mediante notificação extrajudicial.
O outro projeto elaborado pelo governo pretende fortalecer o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e combater monopólios no fornecimento de um mesmo tipo de serviço digital. Também são debatidos meios de controle contra abuso de poder das big techs, empresas do ramo com grande cota de mercado.
‘INCONSTITUCIONAL’. Em novembro de 2024, o STF iniciou a análise do artigo 19 da lei, que prevê que as plataformas só podem ser responsabilizadas pelos conteúdos publicados por terceiros quando elas deixarem de cumprir uma ordem judicial específica de remoção.
A AGU considera o artigo inconstitucional e quer que o Supremo analise rapidamente o tema para, segundo o requerimento, ampliar a segurança de usuários das plataformas e evitar golpes. O pedido traz uma coletânea de mais de 300 anúncios fraudulentos relacionados aos descontos indevidos de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ofertas falsas de ressarcimento.
Uma eventual decisão do STF contra o artigo 19 tem sido apontada como regulação indireta das redes pela Corte, o que já foi classificado como “erro” pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), em entrevista à CNN.
Quanto à resistência do Poder Legislativo em relação ao debate do tema, o deputado afirmou que “não legislar também é uma posição”. “Às vezes, o Congresso pode estar entendendo que aquele não é o momento”, declarou Motta. •