O GLOBO, n 32.328, 09/02/2022. Economia, p. 11
QUEDA DE BRAÇO
Fernanda Trisotto, Camila Zarur, Julia Lindner e Manoel Ventura
BC e Guedes alertam para impacto fiscal, mas PEC Kamikaze” ganha apoio entre governistas
Foi um dia de alertas da equipe econômica para os rumos que o governo está tomando em ano eleitoral. O ministro da Economia, Paulo Guedes, falou em “bomba fiscal” e a ata divulgada pelo Banco Central cita políticas com efeito de baixa na inflação no curto prazo, mas que contribuem para a piora das expectativas sobre os preços adiante. Os avisos não surtiram efeito, e a proposta de emenda à Constituição (PEC) do Senado para zerar impostos sobre combustíveis, gás e luz elétrica — além de benefícios como auxílio a caminhoneiros e ajuda ao transporte público —ganha espaço no Congresso.
O texto, apelidado de “PEC Kamikaze” pela equipe econômica, tem impacto fiscal superior a R $100 bilhões e ganhou endosso do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente, e de integrantes da base do governo na Casa.
QUESTÃO ‘DE SENSIBILIDADE’
Até o momento, 31 senadores já assinaram a PEC. O cálculo inclui quatro parlamentares do PL, o mesmo partido do presidente Jair Bolsonaro, além de três do PP e um do Republicanos(o único do partido na Casa). As três siglas integram a base do governo. Alguns parlamentares fizeram críticas diretas a Guedes, que, em entrevista ao Estado de S.Paulo, afirmou que a PEC pode piorar o cenário de inflação, juros e dólar, anulando os ganhos potenciais da medida.
O resultado foi um dia de declarações contraditórias entre líderes do governo. Ricardo Barros (PP-PR), líder na Câmara, afirmou que o Executivo é contra a “PEC Kamikaze”.
— O governo é contra. Pergunta ao ministro Paulo Guedes. O governo é contra. Qualquer texto —disse Barros.
Já o líder do governo no Senado, Eduardo Gomes (MDB-TO), mudou o tom:
— São tantas ideias, e são ideias conexas, que se complementam. Neste momento o governo está na mesa de negociação tentando encontrar o melhor caminho.
O texto foi apresentado pelo senador Carlos Fávaro (PSD-MT) semana passada e já conta com as assinaturas necessárias para tramitar no Senado. Ele rebateu as críticas de Guedes e defendeu a aprovação do projeto na Casa em fevereiro:
—Esperava mais respeito do ministro da Economia, mas posso dizer com toda a certeza que kamikaze é a política econômica que ele pratica contra o povo brasileiro, que levou 17 milhões de brasileiros para a fila do ossinho. Fávaro disse que a assinatura de Flávio Bolsonaro mostra que a PEC não é “kamikaze”:
— Se o líder do governo assina, se vários senadores da base do governo e o filho do presidente assinam, isso mostra a preocupação com o assunto.
O senador Alexandre Silveira (PSD-MG), convidado a ser líder do governo no Senado e um dos formuladores iniciais do texto, criticou a posição de Guedes sobre a PEC:
— Qualquer um que tem bom senso sabe que o povo brasileiro está sofrendo muito e que precisa haver, por parte da equipe econômica, uma sensibilidade maior. O ministro Paulo Guedes erra, em vez de construir convergência sempre constrói dissenso.
PACHECO VÊ ALTERNATIVAS
Mesmo o líder do governo na Câmara indica que o tema tem a simpatia do presidente e de muitos governistas.
— O presidente Bolsonaro disse o seguinte: “eu quero zerar os impostos federais dos combustíveis”. Como o governo não escreve o texto, porque o governo é contra, quem tem que escrever o texto para isso? A Economia. A Economia é contra, não escreve o texto. O Parlamento está tomando a iniciativa de dar uma solução para o combate à inflação, que é reduzir o combustível do óleo diesel. O governo só vai opinar, se for opinar, no dia em que tiver o texto final. Agora, (a posição) é contra.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco( PSD-MG ), desconversou e indicou que pode haver alternativas às PECs de combustíveis:
—Temos que avaliar a necessidade de apreciar mais algum ponto que seja de índole constitucional. Se eventualmente conseguíssemos materializar todas essas iniciativas em proposições infraconstitucionais ,não haveria, em tese, a necessidade da PEC. Mas é uma avaliação que vamos fazer a partir do debate do PLP 11 e do outro projeto de lei.