Correio Braziliense, n. 22666, 11/04/2025. Economia, p. 8
CPI das BETs reage contra HC a Deolane
Alicia Bernardes
O impasse entre o Senado Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) ganhou novo capítulo com a decisão que livrou a influenciadora e advogada Deolane Bezerra de comparecer à CPI das Bets. O episódio provocou reações duras entre parlamentares e acendeu um alerta sobre os limites da interferência entre os poderes.
A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), relatora da CPI, afirmou ao Correio que já conversou com o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, sobre a sua preocupação com o que vê como interferência indevida nas atribuições do Parlamento.
“Sempre defendi: parem de dizer que o Supremo está legislando.
Quem não legislou fomos nós”, afirmou Soraya, ao reforçar que suas críticas não são ideológicas, mas técnicas. Segundo a senadora, que já atuou no Judiciário, em Mato Grosso do Sul, a lentidão no julgamento de recursos apresentados pela CPI tem comprometido o andamento dos trabalhos. “Nós temos prazo para que não percam o objeto. E não deixem a gente trabalhar”, afirmou.
A ausência de Deolane foi autorizada por liminar concedida pelo ministro André Mendonça, que garantiu habeas corpus à influenciadora, assegurando o direito de não comparecer à comissão.
A medida também estabeleceu que, caso ela decidisse ir, poderia permanecer em silêncio para não se autoincriminar. Antes mesmo da sessão, Deolane publicou nas redes sociais que não compareceria à CPI, em uma manifestação que posteriormente foi apagada.
A Advocacia do Senado Federal recorreu da decisão, que corre sob segredo de Justiça. Ainda assim, a insatisfação entre os parlamentares foi evidente. Soraya, que lamentou a ausência de Deolane na sessão de ontem, afirmou que a comissão pretende apurar se a influenciadora violou o segredo de justiça ao publicar vídeos comentando a decisão. “Nossos advogados estão estudando uma forma de representá-la criminalmente”, declarou.
Para ela, há problemas na forma como os processos são distribuídos na Corte: “Distribuir por prevenção? É nítido que não há prevenção”.
O senador Izalci Lucas (PLDF), integrante da comissão e autor do requerimento que convocou Deolane, foi direto ao criticar a decisão do STF: “Essa decisão do Supremo, ela praticamente enterra todas as CPIs. O Congresso Nacional ou modifica a lei da CPI ou, sinceramente, não é mais instrumento de investigação do Parlamento”. Para ele, o direito ao silêncio não justifica a dispensa da presença. “Proibir de ir é uma coisa, proibir para que ela possa manter o silêncio é outra coisa. Mas tem coisa ali que ela poderia falar que não compromete a investigação que ela está passando”.
A convocação de Deolane foi motivada por seu suposto envolvimento com empresas investigadas na Operação Integration, que apura o uso de plataformas de apostas on-line para lavagem de dinheiro.
Parlamentares esperavam que seu depoimento ajudasse a esclarecer como influenciadores digitais vêm sendo usados para atrair apostadores e se tinham conhecimento de atividades ilícitas ligadas às plataformas.
Soraya foi enfática ao lembrar que o sistema de freios e contrapesos precisa funcionar de forma harmoniosa, sem supremacia de um Poder sobre o outro. “É exatamente na CPI que se materializa o sistema de freios e contrapesos dentro dos três poderes. Nenhum poder pode ser absoluto em nada”, disse a senadora. Embora ressalte seu respeito ao Judiciário, Soraya destaca que é preciso defender a autonomia do Parlamento para que a democracia não sofra prejuízos.