O GLOBO, n 32.329, 10/02/2022. Política, p. 6
PT e bolsonaristas querem cassação de Kataguiri
Melissa Duarte e Cibelle Brito
Deputado argumentou pela descriminalização do nazismo, alegando liberdade de expressão. Entorno de Moro tenta evitar que desgaste do aliado respingue no presidenciável, e líder do MBL, que pediu desculpas, pode ter filiação ao Podemos vetada
Petistas, bolsonaristas e aliados defenderam ontem que o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) tenha o mandato cassado ou renuncie após afirmar que o nazismo não deveria ter sido criminalizado na Alemanha após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), além de se manifestar favoravelmente à legalização de grupos que professam tal ideologia, sob o argumento de liberdade de expressão. As declarações foram dadas em episódio do podcast “Flow”, exibido na última segunda-feira e retirado do ar após uma onda de repúdio. O apresentador Bruno Aiub, o Monark, por sua vez, defendeu a criação de um partido nazista no Brasil e foi desligado da produção.
O “Flow”, que conta com 3,6 milhões de inscritos em seu canal no YouTube, é hoje um dos podcasts de maior alcance no país. Políticos, artistas e jogadores de futebol — há um segmento dedicado ao esporte —deram entrevistas recentemente. Após a polêmica de segunda-feira, patrocinadores suspenderam contratos.
As declarações levaram parlamentares a se decidir pelo pedido de cassação de Kataguiri ao Conselho de Ética na Câmara — o que deve ser feito pelo menos pela bancada do PT, como informou a colunista Bela Megale. Nas redes, algumas publicações associaram Kataguiri a Sergio Moro, pré-candidato à Presidência pelo Podemos.
Em janeiro, o partido chegou a anunciar a filiação do deputado, um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL). Mas agora, segundo o colunista Lauro Jardim , do GLOBO, ele pode ser barrado.
—É um absurdo. No Podemos ninguém compactua com isso — disse o senador Oriovisto Guimarães (PR).
Internautas cobraram uma posição mais contundente de Moro. Anteontem o ex-juiz publicou nas redes que o nazismo é “abominável e inaceitável em qualquer circunstância”, mas não fez menção a Kataguiri ou ao podcast, do qual participou recentemente.
Aliados tentam blindar Moro do desgaste de Kataguiri, de quem é próximo. O senador Alvaro Dias (Podemos-PR) disse ao Valor que o ex-juiz não pode responder pelas declarações de outra pessoa:
— Não se transfere responsabilidade. Essa estultice tem autoria. O autor responde por ela. E só ele.
Na tarde de ontem o deputado publicou um vídeo no qual pediu desculpa. “Tudo o que eu quis defender era a melhor maneira possível de derrotar o nazismo, a melhor maneira possível de sufocar as ideias nazistas, e era justamente isso que eu estava defendendo: que as pessoas, como a comunidade judaica na Alemanha defende, possam ter acesso ao Mein Kampf (livro de autoria de Adolf Hitler) e às outras obras para repudiar e para entender o quanto foi desumano, o quanto foi cruel. Nisso eu acabei falando aquela besteira inaceitável sobre a descriminalização do nazismo, quando queria falar só sobre o acesso às obras, e acho que a melhor maneira de você derrotar e garantir que isso nunca aconteça novamente é esclarecer para todo mundo o quanto isso foi desastroso. Mas minha fala foi infeliz e por isso eu peço a desculpa de vocês”.
Para o senador Renan Calheiros (MDB-AL), Kataguiri desrespeitou vítimas do Holocausto, extermínio de cerca de 6 milhões de judeus. “Apologia ao crime é caso de cadeia, não opinião. Ao defender o nazismo, Monark merece condenação, além da demissão. Já o deputado, cassação por desrespeito às vítimas do holocausto, judeus e aos brasileiros. Não é assunto para a política, mas para a polícia” escreveu Renan Calheiros no Twitter.