O GLOBO, n 32.331, 12/02/2022. Política, p. 8

Em 'Pinda', chapa com Lula deixa ali­a­dos de Alck­min órfãos

Ivan Martínez-Vargas


Políticos que sempre pediram votos para ex-governador agora preferem manter distância. Já a antiga oposição dá apoio

A expressão "tudo que é sólido se desmancha no ar", imortalizada no Manifesto Comunista como uma crítica de Karl Marx e Friedrich Engels ao capitalismo e posteriormente usada por Marshall Berman como título de um ensaio sobre a pós-modernidade, serve também para retratar outro cenário bem mais modesto —a situação atual da política de Pindamonhangaba (SP), no interior paulista. 

Na cidade do Vale do Paraíba onde o ex-governador paulista Geraldo Alckmin (sem partido) nasceu, cresceu e iniciou sua carreira política, a ideia da chapa presidencial com o petista Luiz Inácio Lula da Silva provocou surpresa e um realinhamento de lideranças políticas. O município nunca elegeu prefeitos de esquerda. 

João Bosco Nogueira (MDB), de 80 anos, ex-prefeito de Pindamonhangaba (1973-1976 e 1983-1988), diz ter sido um dos responsáveis por iniciar a carreira política de Alckmin, eleito vereador aos 19 anos, em 1972. Quatro anos mais tarde, apoiou a eleição de Alckmin para prefeito. 

— Geraldo é filho da cidade. O partido no caso dele não é tão importante, não o desfigura. Política é momento e as circunstâncias o levam a se aliar com Lula — diz. 

Bosco diz ter votado em Alckmin no primeiro turno em 2018 e em Bolsonaro no segundo, do que se arrepende. Agora, pensa em ir de Sergio Moro (Podemos). 

O atual prefeito, Isael Domingues (PL), evita se pronunciar sobre o assunto. Seu aliado, o vereador José Carlos Gomes, presidente da Câmara e parlamentar há seis mandatos, afirma, em nota, que a chapa LulaAlckmin "deve ser considerada um avanço das forças políticas democráticas".

Ex-prefeito por dois mandatos (2005-2012), João Ribeiro estudou com Alckmin e já teve como vice Miriam Alckmin, sobrinha do ex-governador. Afastado da política, nega proximidade com a família atualmente, mas vê com bons olhos a aliança com o PT. 

—É por algo que está acima do antagonismo. 

Adversário político de Bosco, Ribeiro e Domingues, Vito Ardito, prefeito por quatro mandatos e dono de uma rádio local, disse ser entusiasta de Alckmin, mas afirma que "é uma coisa radical se expor com Lula". 

—Geraldo teve uma conduta a vida inteira e de repente muda? Tem muita gravação dele falando mal do Lula. As pessoas não vão votar no Lula só por ele. Aqui ainda tem bastante bolsonarista — ressalta o entusiasta de Bolsonaro, para quem Alckmin deveria voltar a governar o estado.

 Único vereador eleito pelo PT em Pindamonhangaba, o metalúrgico Herivelto Vela deixou de ser crítico de Alckmin e agora o quer como cabo eleitoral. Pré-candidato a deputado estadual, mantém um programa na rádio de Ardito.

 —Sempre critiquei o Alckmin, e não mudou nada. Ele continua o mesmo, não vai nunca fazer as políticas progressistas do PT, mas o presidente Lula deixa bem claro que o momento é de buscar convergências —diz ele. 

Em Taubaté, cidade vizinha, o cenário é similar. Ali, a família Ortiz, de tucanos alckmistas históricos, deteve a hegemonia política no município por quatro décadas, mas perdeu a última eleição para um político alinhado com Bolsonaro.

FORA DO SANTINHO

Para o ex-prefeito Bernardo Ortiz Filho (PSDB), o Vale do Paraíba continua antiPT e antiesquerda, embora Bolsonaro tenha perdido boa parte do apoio local. 

—É uma aliança de campos políticos e pensamentos opostos. Não vou ter como usar foto dele no santinho, infelizmente. Eu gosto muito dele, mas não posso —afirma o político. 

O atual prefeito de Taubaté, José Saud (MDB), diz que o movimento de Alckmin "é legítimo, mas vai ter rejeição na região, que é de direita". Adversária de Ortiz e de Saud, Loreny Roberto (Solidariedade), pré-candidata a deputada federal, acredita na aliança e quer Alckmin em seu partido. 

Entre os mais recentes dissidentes do PSDB na região, a aproximação de Alckmin e Lula também é vista com ressalvas. 

—Temos uma proximidade histórica com o Alckmin, mas este movimento que ele faz agora é solitário —afirma o prefeito de São José dos Campos, Felício Ramuth, que trocou o PSDB pelo PSD. —Acho que ele não será mais padrinho eleitoral de políticos da região por estar com o Lula.