O GLOBO, n 32.332, 13/02/2022. Mundo, p. 26
Putin diz que invasão da Ucrânia é ‘especulação’
Presidente russo conversou por telefone com Macron e Biden, que ameaçou com ‘custos severos’ em caso de guerra
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, conversou ontem com os presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e da França, Emmanuel Macron, um dia depois de o governo americano alertar para uma invasão “iminente” da Ucrânia pelas tropas russas que desde dezembro se concentram na fronteira da ex-república soviética. Aos dois, ele negou que pretenda invadir o país vizinho e disse que os alertas a esse respeito são “especulação” e “histeria”, mas não indicou nenhum recuo de suas forças militares.
A Macron, que esteve com ele na última segunda em Moscou, Putin afirmou que o alarme sobre uma invasão não passa de “especulação provocativa” para justificar a entrega de “armamentos modernos” à Ucrânia pelos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), segundo um comunicado do Kremlin depois da conversa de uma hora e 40 minutos. Fontes da Presidência francesa disseram à Reuters que nada no telefonema sugeriu que Putin esteja se preparando para invadir a Ucrânia, mas que a França se mantém “alerta e vigilante” diante da movimentação militar russa, para “evitar o pior”.
SEM RECUO MILITAR
Macron, afirmou um comunicado do Palácio do Eliseu, disse a Putin que um “diálogo sincero” sobre a crise “não é compatível com uma escalada militar” russa na fronteira ucraniana. De acordo com o comunicado, os dois lados prometeram “continuar o diálogo” sobre “a segurança e a estabilidade na Europa” e para implementar os Acordos de Minsk — que visam pôr fim ao conflito de oito anos entre o Exército ucraniano e separatistas pró-Moscou no Leste da Ucrânia.
A conversa com Biden durou pouco mais de uma hora, e uma autoridade americana disse à imprensa que “não houve uma mudança fundamental” na posição de Putin, ao qual os EUA vêm pedindo o recuo das forças russas como prova de que não haverá invasão. Em comunicado, a Casa Branca afirmou que Biden disse a Putin que, se a Rússia invadir a Ucrânia, “os EUA, juntamente com nossos aliados e parceiros, responderão de forma decisiva e vão impor custos rápidos e severos à Rússia”.
“O presidente Biden reiterou que uma nova invasão russa da Ucrânia produziria sofrimento humano generalizado e enfraqueceria a posição da Rússia. O presidente Biden foi claro com o presidente Putin que, embora os EUA continuem preparados para se envolver na diplomacia, em plena coordenação com nossos aliados e parceiros, estamos igualmente preparados para outros cenários”, disse a Casa Branca.
Na versão do Kremlin para a conversa, Biden e Putin concordaram em manter diálogo, apesar de a “histeria” dos EUA sobre uma invasão ter “chegado ao auge”, disse um assessor diplomático do presidente russo, Yuri Ushakov. Ele afirmou ainda que, ao contrário do que sugere a Casa Branca, a ênfase de Biden na conversa não foi em sanções à Rússia.
Apesar de negar ter planos de invasão, a Rússia concentrou cerca de 100 mil militares em sua fronteira com Ucrânia e realiza exercícios militares na vizinha Bielorrússia desde a semana passada. Ontem, o Ministério da Defesa russo informou que 30 navios foram deslocados para exercícios no Mar Negro, o que deixa a Ucrânia cercada por quase todos os flancos. Eles se juntarão a outros navios russos que chegaram nas últimas semanas, alcançando um total de mais de 140 navios, além de mais de 60 aeronaves e cerca de 10 mil fuzileiros navais.
EUA TIRAM DIPLOMATAS
Ontem, os EUA ordenaram que todo o seu pessoal diplomático não essencial se retire da Ucrânia, e o Pentágono informou que também sairão os 160 integrantes da Guarda Nacional americana que estão no país para treinar tropas ucranianas. Vários outros países, como Alemanha, Jordânia e Arábia Saudita, também pediram que seus cidadãos deixem a ex-república soviética. Além disso, o Kremlin informou que está retirando parte de seu pessoal diplomático da embaixada em Kiev e de seus três consulados na Ucrânia, dizendo que a decisão é uma resposta às medidas semelhantes anunciadas pelos países ocidentais e seus aliados.
Enquanto isso, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que os alertas de ataque russo ao seu país “provocam pânico e não são úteis” e pediu aos EUA evidências firmes de que haverá uma invasão. Em Kiev, milhares de ucranianos foram às ruas mostrar união em meio aos temores de uma invasão russa. No centro da cidade, eles cantaram “glória à Ucrânia” e carregaram bandeiras do país, além de exibir faixas dizendo “ucranianos vão resistir” e “os invasores devem morrer”.
INCIDENTE NO PACÍFICO
Em meio à tensão, o Ministério da Defesa em Moscou afirmou que um navio militar russo forçou um submarino americano a sair de águas territoriais do país no Pacífico. O submarino teria sido detectado perto das Ilhas Curilas, no extremo Leste da Rússia, e intimado a “subir à superfície” antes de os russos usarem “meios apropriados” para fazer a embarcação deixar as águas russas. O ministério disse que o adido militar americano foi chamado a dar explicações, mas os EUA negaram que o incidente tenha ocorrido.