O Estado de S. Paulo, n. 48109, 06/07/2025. Economia & Negócios, p. B1

País celebra safra recorde, mas não tem onde guardar produção
José Maria Tomazela

 

A safra brasileira de grãos deve chegar a 336,1 milhões de toneladas, a maior da história, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mas a capacidade total de armazenamento do País é de apenas 212,6 milhões de toneladas, informa José Maria Tomazela. O restante pode ficar estocado ao relento, como aconteceu em anos anteriores. Do lado do produtor, a falta de locais para guardar principalmente milho e soja encarece o frete, por causa da maior procura por escoamento. A indústria também perde, porque precisa estocar matéria-prima, o que aumenta os custos de produção, e o consumidor tem de

“Já chegamos ao absurdo de usar caminhões como silos por falta de armazéns” Elisangela Lopes, da CNA

pagar mais pelo produto final. “Há duas décadas, a produção de grãos cresce em média 5,3% ao ano e a capacidade de armazenagem, 3,4%”, afirma Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). O alto custo para financiar novos armazéns e a falta de mão de obra especializada são apontados como principais causas do problema.

O Brasil vai colher a maior safra de grãos da história, mas não tem onde guardar toda a produção. A colheita deve chegar a 336,1 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), mas a capacidade total dos armazéns agrícolas é de 212,6 milhões. Assim, 124,3 milhões de toneladas de grãos como soja e milho podem ficar ao relento, como aconteceu em anos anteriores.

Do lado do produtor, a falta de armazéns encarece o frete, pois há uma procura maior para o escoamento da safra. A indústria também perde, pois precisa comprar a safra e estocá-la, o que encarece a produção. Na outra ponta, o consumidor tem de pagar mais pelo produto final.

O alto custo para financiar novos armazéns e falta de mão de obra especializada são apontados por analistas como os motivos para o problema.

A escassez de armazéns tem se tornando crônica, segundo Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). “É uma conta que não fecha: há duas décadas a produção de grãos cresce em média de 5,3% ao ano, mas a capacidade de armazenagem segue em ritmo mais lento, de 3,4% ao ano”, diz.

Os números da CNA mostram que, em 2005, o País colheu 114,7 milhões de toneladas e armazenou 106,5 milhões. Em 2015, para uma colheita de 208,6 milhões de toneladas, havia capacidade para 169,7 milhões, déficit de 39 milhões. Agora, pouco mais da metade dos grãos colhidos – 63,3% – têm armazém garantido. Se considerar os silos e armazéns que estão dentro das fazendas, esse porcentual cai para apenas 16,8%.

A Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) recomenda que a capacidade estática de armazenamento de um país deve ser 1,2 vez maior que a sua produção anual. Nesta safra, o Brasil deveria ter armazéns para mais de 400 milhões de toneladas – menos de o dobro do disponível.

Paulo Bertolini, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho e Sorgo (Abramilho), cita outro agravante: a sequência das duas principais safras. “A safra maior de milho vem logo após a colheita da soja. Os espaços dos armazéns estão ocupados e a soja tem valor de tonelada que é o dobro do milho. Assim, o milho fica sem espaço nos silos e o grão, muitas vezes, vai para céu aberto, exposto a sol e chuva.”

Para se livrar do risco, assim que colhe, o produtor tenta colocar a produção. “Aí você tem outros dois problemas: os preços desabam devido à grande oferta e o frete aumenta, em razão da alta demanda. A indústria, forçada a comprar, acaba fazendo armazenagem de longo prazo, que encarece sua produção. É ruim para todo mundo.” •

EM NOVAS REGIÕES PRODUTORAS, ATÉ CAMINHÃO É USADO COMO SILO. PÁG. B2

Discrepância

Há 20 anos, a produção de grãos cresce, em média, 5,3% ao ano, enquanto a área de armazéns, 3,4