VALOR ECONÔMICO, n 5411, 06/01/2022. Brasil, A3

Depois de polêmicas, governo confirma vacinação infantil
Murillo Camarotto, Isadora Peron e Rafael Vazquez
 


O Ministério da Saúde confirmou ontem a inclusão de crianças de 5 a 11 anos no programa de vacinação contra a covid-19. A expectativa do governo é que as doses da Pfizer comecem a chegar no dia 13 e que sigam para os Estados e municípios no dia 14, quando a aplicação já poderia ser iniciada. No fim do dia, no entanto, a farmacêutica americana disse que iniciará a entrega de 20 milhões de doses de sua vacina para crianças a partir do dia 10 e que as remessas devem terminar no primeiro trimestre.

Crianças com comorbidades e aquelas que vivem em áreas indígenas ou quilombolas terão prioridade pelo cronograma do governo. Em seguida, a imunização obedecerá ordem decrescente, dos mais velhos até os mais novos. O intervalo entre a primeira e a segunda doses será de oito semanas. Apesar de a bula prever um intervalo de apenas três semanas, os estudos em adultos demonstraram que o período mais longo produz uma concentração maior de anticorpos neutralizantes.

Ontem, o país registrou 27,6 mil novos casos de covid-19, segundo o consórcio de veículos de imprensa. A média de novos casos nos últimos sete dias é de 12.391, alta de 318% em relação aos casos contabilizados em 14 dias. Foram apuradas ainda 133 mortes pela doença. A média móvel de novas mortes no Brasil na última semana foi de 98 por dia, uma baixa de 2% sobre a vacinação em 14 dias.

As crianças que forem aos postos de vacinação acompanhadas dos pais não precisarão apresentar qualquer autorização por escrito, que será exigida apenas daquelas levadas por outras pessoas.

Antes do comunicado divulgado pela Pfizer, o governo já dizia que receberia 20 milhões de doses pediátricas no primeiro trimestre, das quais 3,7 milhões ainda em janeiro. Outras 20 milhões deverão chegar até junho, segundo informou o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz.

Após ameaçar exigir prescrição médica para a aplicação nas crianças, o ministério decidiu apenas recomendar que os pais ouçam a opinião de um profissional. Essa foi a forma de o ministro Marcelo Queiroga afagar o presidente Jair Bolsonaro, que é contrário à vacinação e às medidas de prevenção à covid-19.

Queiroga afirmou que “ninguém com contraindicação” deve ser vacinado. “Procurar um médico não deixa o pai inseguro, muito pelo contrário”, afirmou.

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), estava aguardando a posição oficial do governo e pretendia derrubar uma eventual exigência de prescrição. Nas últimas semanas, partidos de oposição pediram que Lewandowski obrigasse o governo a iniciar imediatamente a campanha de vacinação. O ministro, no entanto, atendeu a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), que afirmou que a decisão seria anunciada até ontem.

Em coletiva de imprensa, Queiroga afirmou que Bolsonaro defende apenas a “liberdade” das pessoas escolherem se querem ou não tomar a vacina.

Diferentemente do que ocorreu com a liberação das vacinas para jovens entre 12 e 18 anos, o governo promoveu uma polêmica consulta e audiência públicas sobre a imunização infantil.

Questionada sobre a motivação, a secretária especial da covid-19, Rosana Leite, disse que trata-se de um público “especial”. “O cuidado não foi excessivo. É um público extremamente caro para nós. Sempre recebemos muitas demandas da população e, nesse caso específico, isso aumentou muito”, afirmou.

Entidades médicas e cientistas se posicionaram em peso nos últimos dias em favor do início da vacinação das crianças, lembrando que a Anvisa já deu o aval técnico e que a outros países têm adotado a imunização a partir dos 5 ano.

A chegada das doses pediátricas, segundo Rodrigo Cruz, não deverá acarretar em falta de vacina para o calendário de reforço do público adulto.

A aplicação da vacina da Pfizer em crianças foi aprovada no dia 16 de dezembro pela Anvisa. A autorização foi seguida de ataques de Jair Bolsonaro, que ameaçou divulgar os nomes dos servidores responsáveis pela análise.