VALOR ECONÔMICO, n 5408, 31/12/2021, 1, 2 e 3 de janeiro de 2022. Brasil, A3
Otimismo para PIB está no lado da oferta, diz Sachsida
Marina Ribeiro
Com uma previsão bem mais otimista que a do mercado para o desempenho da economia em 2022, o secretário de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, afirma que para entender essa diferença de visão é preciso olhar a economia pelo lado da oferta. Em entrevista ao Valor, ele admitiu que há dificuldades para projetar o crescimento do ano, mas defendeu que o avanço de medidas que estimulem a oferta agregada e a normalização de choques negativos verificados em 2021 darão vigor à retomada.
“Não temos compromisso com o erro. Se verificarmos a necessidade de alterar a projeção, faremos isso com a maior serenidade”, disse.
Atualmente, a SPE projeta que a economia crescerá 2,1% em 2022, bem acima do estimado por analistas, que no boletim Focus mais recente falavam em 0,4%. Algumas casas já esperam queda do Produto Interno Bruto (PIB) no ano. Recentemente, o Banco Central (BC) cortou sua projeção de 2,1% para 1%.
Sachsida defendeu que os três principais choques negativos sobre a economia em 2021 foram de oferta. Ele citou a covid-19, os eventos climáticos adversos e a quebra nas cadeias globais de produção. “A pandemia, na minha leitura, teve vários choques econômicos, mas os principais foram de oferta”, afirmou. Assim, de acordo com ele, esse é o lado da economia que está “comandando” a trajetória no momento.
O secretário afirmou ainda que o foco de atuação da equipe econômica está justamente em medidas que aumentem a competição e a produtividade no país. “Nós montamos o binômio econômico, consolidação fiscal e reformas pró-mercado, olhando a curva de oferta agregada”, afirmou. Entre os principais avanços nessa agenda, destacou o marco legal do saneamento. “Os novos marcos legais vão gerar o ‘crowding in’ necessário para aumentar a produção.”
Sachsida avalia que, por sua vez, a maior parte dos analistas de mercado usa, no curto prazo, modelos de demanda, considerando fatores como o efeito da alta dos juros sobre o consumo. Atualmente, a Selic está em 9,25% ao ano e o BC já sinalizou nova alta. “É por isso que alguns economistas têm previsões tão negativas para a economia no ano.”
Ele ponderou que ainda é preciso observar fatores como a evolução da pandemia e da crise hídrica, mas acrescentou que “a expansão da oferta agregada e a normalização dos choques negativos de oferta que ocorreram em 2021 vão gerar uma expansão mais robusta em 2022”.
Questionado sobre a discrepância entre as estimativas para o PIB, Sachsida reiterou que a SPE acertou ao estimar que a queda em 2020 seria inferior a 5%. Disse ainda que, além da pasta, Itaú e Bradesco estão entre as instituições que costumam apresentar previsões precisas. Atualmente, o Itaú projeta queda de 0,5% do PIB em 2022. Já o Bradesco, alta de 0.75%.
“O que chama atenção no ano é a dificuldade para projeções. A discrepância é grande”, afirmou. “Tenho certeza de que o Itaú, se verificar que está errado, vai mudar [a projeção], o Bradesco vai mudar e pode ter certeza que, se eu verificar que estou errado, vou mudar também.”
Em dezembro, após a divulgação do PIB do terceiro trimestre, com queda de 0,1%, analistas avaliaram que a economia estava estagnada. Entre os desafios à frente, citaram a inflação, juros em alta, falta de insumos, mercado de trabalho fraco, incertezas fiscais e políticas e o receio quanto à evolução da pandemia. O ministro da Economia, Paulo Guedes, vem buscando reverter esse pessimismo, ao destacar, por exemplo, dados positivos sobre a trajetória fiscal.
Para ele, o PIB do terceiro trimestre está entre os dados que “vieram de maneira desfavorável ao Brasil”. Por outro lado, acrescentou, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) está registrando “dados muito bons”. Ele defendeu que o cenário para o emprego é positivo, apesar das sequelas da covid-19 sobre o mercado de trabalho.
As informações da Pnad mostram uma trajetória de redução do desemprego, mas a renda média, por exemplo, atingiu o menor nível da série histórica. Para o secretário, esses sinais de fragilidade no emprego não estão ligados a questões conjunturais, mas de longo prazo. “Não é um problema que vá se resolver com uma medida de curto prazo. É algo que vamos ter que endereçar nos próximos dez ou 20 anos”, disse, acrescentando que a SPE criou um grupo de trabalho para discutir os efeitos da pandemia sobre a economia.
O secretário refutou a visão de que a agenda econômica não avançará devido ao ano eleitoral. Ele admitiu que o andamento de grandes reformas, como a tributária, fica prejudicado. Defendeu, no entanto, que é possível aprovar duas das prioridades da secretaria: o projeto de lei que reforma o sistema de garantias e a medida provisória (MP) que estabelece que cartórios de registro deverão oferecer serviços de forma on-line.
“Será uma das maiores contribuições da história econômica. Com essas aprovações, daremos um salto de produtividade”, afirmou. Entre as propostas que ainda podem avançar, citou também o novo marco do setor elétrico e os projetos de privatização da Eletrobras e dos Correios.
Sachsida buscou minimizar os efeitos do período eleitoral na economia, como aumento da volatilidade e maior pressão por gastos. “Essa é a beleza do teto de gastos. Pode vir a pressão que vier, para eu gastar mais em um lugar, tenho que gastar menos em outro”, afirmou, reforçando a visão defendida pela equipe econômica de que o arcabouço fiscal segue forte apesar das mudanças trazidas pela proposta de emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, agora promulgada.
Um debate sobre aumento de despesa já em curso é o do reajuste do funcionalismo. Desde o indicativo de que as carreiras policiais receberão aumento neste ano, cresce a pressão de outras categorias sobre o governo. Ao comentar o tema, Sachsida repetiu que, mesmo em caso de reajuste, ele ficará sob o teto. Aproveitou sua fala também para criticar a possibilidade de concessão de aumento nos Estados. “É melhor dar aumento de salário para funcionário público estadual ou fortalecer os programas de renda estaduais? Ou baixar impostos?”, questionou.