O Estado de S. Paulo, n. 48099, 26/06/2025. Política, p. A10
Congresso derruba tarifaço de Lula, mas eleva número de deputados
Naomi Matsui
Num intervalo de pouco mais de uma hora, Câmara e Senado, em sessões distintas, derrubaram decreto do governo que elevava alíquotas do IOF para algumas aplicações financeiras. Enquanto deputados de oposição cobravam corte de gastos pelo governo e atacavam o aumento de imposto, o Senado aprovava o aumento do número de deputados federais de 513 para 531 – elevação logo referendada pela Câmara. No caso do IOF, foi anulada a taxação de 5% das LCIs e LCAs. Títulos públicos e CDBs teriam alíquota única de IR de 17,5%, o que também caiu. O governo foi surpreendido com a decisão do Congresso de votar a matéria ontem, em sessão semipresencial e em semana de festas juninas. A ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) disse que, com a derrubada da alta do IOF, o governo terá de bloquear ou contingenciar mais R$ 10 bilhões do Orçamento. O presidente Lula estuda a possibilidade de tentar derrubar no STF a decisão do Congresso. Antes, pretende se reunir com os presidentes da Câmara e do Senado.
O Congresso aprovou na noite de ontem o projeto de lei que amplia de 513 para 531 o total de deputados federais no Brasil. A ampliação do número de parlamentares na Casa recebeu aval do Senado e, como o texto foi modificado, ele precisou retornar para a análise da Câmara – que também aprovou, poucas horas depois, a modificação. A redação final seguirá para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se sancionada, a regra já valerá para a eleição de 2026.
O prazo dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Congresso estabeleça a nova distribuição de cadeiras com base no Censo de 2022 terminaria em menos de uma semana, em 30 de junho.
No Senado, foram 41 votos favoráveis – o mínimo necessário – e 33 contra. A votação da redação final terminou com a rejeição de um destaque (trecho separado). Na Câmara, o texto com as modificações foi aprovado por 361 votos, contra 36 contrários e 30 abstenções.
O relator no Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), acatou uma emenda para proibir que a alteração eleve gastos públicos. Ele, no entanto, modificou o teor da sugestão para retirar as emendas parlamentares da restrição.
Segundo Castro, não haverá, porém, aumento do volume total de emendas. “As emendas parlamentares não podem ser aumentadas, porque é um porcentual. As emendas individuais correspondem a 2% da receita corrente líquida do ano anterior. Pode dividir os 2% por 513 ou por 531. O ônus para o erário é o mesmo”, afirmou.
Pelo texto aprovado, Santa Catarina, Pará, Amazonas, Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, Ceará, Paraná e Rio Grande do Norte ganharão novos assentos.
‘JEITINHO’. Durante a votação no Senado, PL, MDB e PT liberaram suas bancadas. O Novo orientou contra e tentou travar a votação, alegando que o projeto não foi analisado pelas comissões do Senado e que a sessão estava esvaziada por conta das festas juninas no Nordeste.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE), contrário à mudança, afirmou que o STF determinou apenas a revisão da distribuição do número de cadeiras, não o aumento de vagas.
“É o jeitinho brasileiro. Vão aumentar para ninguém perder. Aumentar o número de deputados é uma invenção do Congresso”, declarou Girão.
Castro, rebateu e disse que a decisão do STF não proibia novos assentos. “Em nenhum momento, o Supremo disse que o número tinha de ser manter em 513. Pelo contrário, o número será estabelecido pelo Congresso”, afirmou.
EFEITO CASCATA. Para o relator, o projeto está “isento de qualquer impacto orçamentário e financeiro”. Um levantamento do Estadão/Broadcast mostrou, porém, que, por causa do efeito cascata, o projeto abre margem para criação de 30 novas vagas de deputados estaduais, que podem custar mais de R$ 76 milhões por ano para os Estados – somado ao gasto extra de R$ 64,8 milhões da Câmara, o impacto total da proposta ultrapassa os R$ 140 milhões anuais.
O levantamento considerou portais de transparência de cada Legislativo estadual para calcular o custo de um deputado, levando em conta salário, cota parlamentar, auxílios e verba destinada ao pagamento de salários para os assessores do gabinete.
A conta final pode ser ainda mais cara: como as novas cadeiras valeriam apenas a partir da eleição de 2026, os salários e benefícios podem ser reajustados até lá.