Correio Braziliense, n. 22696, 11/05/2025. Política, p. 2

Efeitos da segunda onda de desgastes



Para o cientista político Rudá Ricci, presidente do Instituto Cultiva, a crise envolvendo fraudes no INSS pode não ter efeitos diretos no resultado eleitoral de 2026, mas consolida um momento de fragilidade e frustração social que já vinha sendo percebido entre os apoiadores históricos do governo Lula. Ele classifica o episódio como uma “segunda onda” de desgaste, que se soma a crises anteriores como a do Pix, a alta da inflação e o acirramento institucional entre Executivo e Congresso.

Segundo Ricci, o presidente Lula cometeu um erro estratégico ao abdicar da mobilização popular como ferramenta política, ao priorizar o que ele chama de “estabilidade institucional”. De acordo com seus contatos no governo, ele afirma que o Palácio do Planalto evita confrontos diretos com a extrema direita por avaliar que o bolsonarismo ainda domina as ruas. “O Lula não quer uma comunicação agressiva nem mobilização do PT. Avalia que o bolsonarismo tem mais força de rua do que os setores progressistas.

Na primeira reunião com seus ministros, o presidente disse que seu governo seria para restabelecer a estabilidade constitucional e democrática. Isso significa frear qualquer tipo de impacto ou articulação de rua. Ele vem há dois anos desmobilizando tudo o que poderia reagir ao bolsonarismo.” O deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP) lista ao menos três efeitos negativos imediatos para o governo: o desgaste eleitoral, a perda de apoio parlamentar e o aprofundamento da crise fiscal. “Você tem perda de base, não só eleitoral, mas no Congresso.

Ninguém quer mais se associar a um governo que ‘rouba até develhinho’. A saída do PDT da base já mostra isso. A tendência é de que mais parlamentares tentem se desvincular.

Além disso, o rombo aumenta o desequilíbrio das contas públicas. Já havia um buraco na Previdência. Agora, é um buraco dentro do buraco. Isso impacta inflação, juros e tudo mais. O governo está gerenciando a própria crise que criou.” Para o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), é necessário a instalação imediata de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ou uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para aprofundar as investigações e responsabilizar todos os envolvidos, independentemente da gestão ou filiação política. “Precisamos aprofundar as investigações com a instalação de CPI ou da CPMI e punir todos os envolvidos, não importando de que gestão seja”, declarou.

Embate O deputado federal Arlindo Chinaglia (PT-SP), por sua vez, defende que as investigações da Polícia Federal sobre a fraude no INSS apontam para irregularidades originadas nos governos anteriores, especialmente nas gestões de Michel Temer e Jair Bolsonaro. Ele reconhece que houve corrupção e que é necessário punir todos os responsáveis, mas critica a criação de uma CPI, por entender que as instituições competentes já estão atuando. “Teve corrupção e precisa ser apurado. Todos os envolvidos e responsáveis devem ser punidos. Mas não há entidades mais capacitadas para isso do que a Polícia Federal e a Advocacia-Geral da União. O INSS precisa, sim, ser revirado pelo avesso”, afirmou o deputado, reforçando o posicionamento do presidente.

Sobre o impacto político da crise para o governo Lula nas eleições de 2026, o deputado admite que a oposição tem domínio das redes sociais, mas critica o uso de fake news e desinformação, citando o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) como exemplo. “Eles têm mais dinheiro e habilidades com os algoritmos.

Sabem atingir o público que consome esse tipo de conteúdo.

Não descarto que muita gente acredite no que eles falam. Mas está comprovado que a fraude ocorreu durante o governo anterior. Nós não temos medo do embate. Ganharemos porque agimos com a verdade”, garantiu Chinaglia.