O GLOBO, n 32.335, 16/02/2022. Mundo, p. 17
De máscara e testado, Bolsonaro chega à Rússia
Jussara Soares
Presidente desembarca em Moscou e se reúne hoje com Putin após série de testes anti-Covid do rígido protocolo sanitário do Kremlin; na pauta, discussões sobre cibersegurança e ciberdefesa, entre outros temas
O presidente Jair Bolsonaro desembarcou na Rússia ontem pouco depois das 16h (10h em Brasília). Ele saiu do avião presidencial usando máscara, acessório que costuma ignorar quando está no Brasil. Bolsonaro vai se reunir hoje com o presidente russo, Vladimir Putin, e, para isso, teve de se submeter a teste de Covid-19, atendendo as exigências sanitárias do governo local. Na pauta de conversas figura, entre outros temas, a segurança cibernética.
O presidente e integrantes da comitiva fariam um último teste antes da reunião com Putin, na manhã de hoje. Só após o resultado é que o cerimonial do governo russo definiria o formato do encontro — ou seja, se Bolsonaro será recebido na mesa gigante, de seis metros, assim como o presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão, Olaf Scholz, ou se terá uma interação mais próxima, como o argentino Alberto Fernández. Macron, que se reuniu com Putin em 7 de fevereiro, e Scholz, que se encontrou com o russo ontem, rejeitaram fazer o teste com médicos locais, para evitar dar amostras de DNA ao governo russo.
O presidente e integrantes da comitiva fariam um último teste antes da reunião com Putin, na manhã de hoje. Só após o resultado é que o cerimonial do governo russo definiria o formato do encontro — ou seja, se Bolsonaro será recebido na mesa gigante, de seis metros, assim como o presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão, Olaf Scholz, ou se terá uma interação mais próxima, como o argentino Alberto Fernández. Macron, que se reuniu com Putin em 7 de fevereiro, e Scholz, que se encontrou com o russo ontem, rejeitaram fazer o teste com médicos locais, para evitar dar amostras de DNA ao governo russo.
Bolsonaro foi recebido pelo vice-chanceler Sergey Ryabkov e pelo diretor do Departamento de Protocolo Estatal, Igor Bogdashev. Ele foi do aeroporto ao Hotel Four Seasons, na Praça Vermelha, aonde chegou pouco antes das 17h, tendo entrado por uma porta lateral. À noite, ele saiu para uma visita de 1h30 ao Kremlin, sem a presença de autoridades locais.
CIBERATAQUES RUSSOS
Por causa da tensão e dos alertas emitidos pelos EUA e por outros países do risco de uma invasão iminente da Rússia na Ucrânia, país no centro de uma crise internacional na Europa, a visita de Bolsonaro foi alvo de críticas. Como havia um temor de auxiliares da Presidência de que a agenda bilateral com Putin pudesse ser mal avaliada pela Casa Branca, Bolsonaro foi aconselhado a pregar a paz e uma solução diplomática em todas suas declarações durante a estada em Moscou.
Diplomatas brasileiros argumentam que o convite de Putin foi feito antes de a crise ganhar maiores proporções, lembrando repetidamente que os dois países têm relações comerciais que justificam o encontro com Putin, previsto para ocorrer hoje entre 13h e 15h no horário local.
Nas redes sociais, Bolsonaro publicou ontem, pouco antes das 14h, que já estava no espaço aéreo russo. Ele também divulgou uma imagem mostrando a notícia de que a Rússia anunciou a retirada de algumas tropas enviadas à fronteira com a Ucrânia. Na segunda-feira, Bolsonaro e o vice-presidente Hamilton Mourão minimizaram a tensão entre Rússia e Ucrânia, e defenderam a realização da viagem.
A segurança cibernética e a ciberdefesa estarão entre os assuntos do encontro de duas horas entre Bolsonaro e Putin. Os russos sofrem acusações dos EUA e de outros países de promoverem ataques cibernéticos pelo mundo. Um relatório da investigação do Departamento de Justiça dos EUA acusou a Rússia de interferência “sistemática e abrangente” nas eleições presidenciais americanas em 2016, quando Donald Trump foi eleito.
Em janeiro, houve um ataque em larga escala contra a Ucrânia. Em junho, pela primeira vez, Rússia e EUA iniciaram conversas sobre segurança cibernética, no primeiro encontro entre os mandatários dos dois países em Genebra.
A expectativa do lado de brasileiro é buscar uma cooperação na área de segurança digital. Os detalhes dessa pauta do encontro bilateral foram elaborados, no Brasil, pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo ministro Augusto Heleno e responsável pela área no governo. Além de Heleno, outros dois generais acompanham a comitiva: o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Luiz Eduardo Ramos. Ambos têm se dedicado a municiar Bolsonaro sobre suposta insegurança nas urnas eletrônicas, tema frequentemente levantado, sem provas, pelo presidente.
ATAQUE AO VOTO ELETRÔNICO
Atrás nas pesquisas de intenção de voto, Bolsonaro constantemente ataca a confiabilidade das urnas eletrônicas. Na semana passada, o presidente disse, em transmissão ao vivo, que as Forças Armadas tinham detectado uma série de vulnerabilidades no sistema de votação brasileiro. Depois disso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informou que o questionamento feito pelos militares foi de “natureza técnica”, negando “qualquer comentário ou juízo de valor sobre segurança ou vulnerabilidades. As declarações que têm sido veiculadas não correspondem aos fatos nem fazem qualquer sentido”, afirmou a corte, em nota.
O assunto da segurança das urnas é acompanhado de perto por Braga Netto, que tenta se cacifar como vice de Bolsonaro na eleição de outubro. Por sua vez, Ramos foi o responsável por promover a transmissão ao vivo nas redes sociais em que Bolsonaro fez acusações sem provas sobre supostas fraudes nas urnas eletrônicas em julho de 2021. A Polícia Federal chegou a abrir um inquérito e concluiu que o presidente “promoveu desinformação” e “defendeu teorias da conspiração”.
AGRONEGÓCIO E ENERGIA
O encontro de Bolsonaro com Putin no Kremlin inclui uma reunião bilateral e um almoço. Há a previsão que eles façam uma declaração conjunta à imprensa. Além de tratar da ciber segurança e defesa, os presidentes também falarão sobre ciência e tecnologia, energia e agronegócio.
Um dos pontos principais para o governo brasileiro é buscar um compromisso de que a Rússia siga exportando insumos para a produção de fertilizantes. O Brasil também quer exportar mais produtos acabados para os russos, que tentarão vender mais insumos e defensivos agrícolas. O ponto alto será a confirmação da compra da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados (UFN3) da Petrobras, em Três Lagoas (MS), pelo grupo russo Acron.
Antes da reunião com Putin, Bolsonaro fará uma visita ao Túmulo do Soldado Desconhecido. Em seguida, ele se encontrará com o líder da Câmara Baixa do Parlamento e participará de um encontro de empresários dos dois países.