O GLOBO, n 32.338, 19/02/2022. Política, p. 7

Aras trava mais uma apuração contra Bolsonaro

Aguirre Talento e Mariana Muniz


Procurador-geral da República pediu o arquivamento de inquérito sobre suspeita de prevaricação no caso Covaxin; praxe do Supremo é atender à PGR. Polícia Federal também isentou presidente da prática de crime

O procurador-geral da República Augusto Aras pediu, ontem, o arquivamento de outro inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro, desta vez envolvendo suspeitas de prevaricação ao tomar conhecimento de supostas irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.

É a primeira investigação originada pela CPI da Covid que chega à conclusão. O caso veio à tona depois que o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda afirmou, em depoimento, que foi pressionado a assinar um documento que previa o pagamento antecipado para a compra da vacina indiana, contrariando o que estava disposto no contrato firmado com a empresa Precisa Medicamentos, intermediadora do laboratório Bharat Biotech no Brasil.

Miranda relatou os fatos a Bolsonaro em uma reunião no Palácio da Alvorada, mas o presidente na ocasião não pediu à Polícia Federal (PF) a abertura de investigação.

FORA DO ESCOPO 

O relatório apresentado pela PF no início do mês já isentava Bolsonaro da prática de crimes. Para a Polícia Federal, mesmo tomando conhecimento de possíveis irregularidades, Bolsonaro não tinha obrigação de comunicar a outros órgãos essas suspeitas para deflagrar a abertura de investigações, pois esse ato não faz parte das funções do cargo de presidente da República. A PF citou que a ausência de comunicação dessas irregularidades poderia ser um descumprimento “do dever cívico, mas não desvio de um dever funcional”.

Na manifestação protocolada no STF às 18h40, Aras pede que o inquérito sobre prevaricação de Bolsonaro e outro processo envolvendo o caso Covaxin “sejam arquivados de forma conjunta”. Neste documento, o procurador geral da República não apresentou detalhes do seu posicionamento sobre a suspeita de crime envolvendo Bolsonaro, apesar de informar que pediu o arquivamento.

Caberá agora à ministra Rosa Weber, relatora do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), despachar o pedido de arquivamento. A praxe no STF é que o ministro siga o pedido da PGR, já que o órgão é titular da ação penal e único com competência para investigar políticos com foro privilegiado.

É o segundo arquivamento solicitado nesta semana por Aras contra o presidente. Anteontem, o procurador-geral da República contrariou parecer da PF que apontava a prática do crime de violação de sigilo funcional no vazamento de documentos, por parte do presidente, relativos à investigação sobre um ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Neste caso, o inquérito tramita sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, que ainda não despachou sobre o arquivamento. Isso deve ocorrer nos próximos dias.

Ainda há outras duas linhas de investigação envolvendo a Covaxin. Uma delas é um inquérito da Polícia Federal aberto especificamente para apurar se houve irregularidades no contrato de aquisição do imunizante pelo Ministério da Saúde, que teve valor de R$ 1,6 bilhão. Após o surgimento de suspeitas, o próprio ministério rescindiu a contratação, que previa o fornecimento de 20 milhões de doses.

Ainda há uma investigação preliminar da PGR no STF envolvendo as conclusões da CPI da Covid sobre as suspeitas de prevaricação da Covaxin. Nesta, outros personagens envolvidos podem ser alvos de investigação, mas os fatos atribuídos a Bolsonaro também devem ser arquivados.