O GLOBO, n 32.341, 22/02/2022. Política, p. 8

Policiais protestam, anunciam paralisação e pressionam Zema

Lucas Mathias


Cobrança de aumento salarial gera choque com o governador, eleito na onda do bolsonarismo e pré-candidato à reeleição

Agentes de segurança de Minas Gerais — policiais civis, militares, penais, bombeiros militares e agentes socioeducativos —anunciaram uma paralisação a partir de hoje. O motim foi confirmado em assembleia que ocorreu ontem, durante manifestação nas ruas de Belo Horizonte por reajuste salarial. A dez meses das eleições, a decisão aumenta a pressão sobre o governador Romeu Zema (Novo), que deve buscar um novo mandato e, em 2018, foi eleito com votos atrelados ao bolsonarismo, grupo ao qual as categorias que vêm cobrando aumento são em parte alinhadas.

Em busca de apoio de policiais, governadores de 17 estados já deram aumentos de salário ou enviaram para debate nas assembleias propostas de reajuste, conforme mostrou o GLOBO no domingo. A Constituição proíbe a greve de policiais e integrantes das Forças Armadas. As forças de segurança reivindicam recomposição salarial para corrigir a perda com a inflação. Em 2020, Zema havia feito acordo com os policiais e enviou projeto de lei à Assembleia Legislativa que previa recomposição de 41% para os profissionais, a ser paga em três parcelas. No entanto,depois de aprovado pelo Legislativo, somente a primeira parcela foi paga, após Zema vetar as duas últimas. Os servidores querem que o governador cumpra o acordo inicial.

O protesto ontem começou na Praça da Estação, de onde os manifestantes partiram até a Praça Sete, antes de chegarem à Praça da Assembleia, na Região Centro-Sul de BH. Segundo o presidente da Associação Mineira dos Policiais Penais e Servidores Prisionais, Luiz Gelada, haverá uma “assembleia extraordinária conjunta com todas as associações e sindicatos” sobre a paralisação dos agentes. Para ele, porém, “a greve já está acontecendo”.

—A paralisação é essencial. Não estamos conseguindo segurar a tropa, está insustentável. Vamos deliberar somente o essencial para garantir a segurança nas unidades prisionais. Mas se o governo não se posicionar e garantir a recomposição salarial ou negociar, é a tendência —diz.

Em nota, o governo de Minas Gerais informou que necessidade de reposição salarial. Segundo o governo, o estado se mantém aberto ao diálogo e em busca de uma solução, “mas com responsabilidade e previsibilidade fiscal”. E condiciona a recomposição dos salários à adesão ao regime de recuperação fiscal. O governo diz ainda que acompanha as manifestações dos servidores e “confia que os integrantes da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros, da Polícia Civil e da Polícia Penal não deixarão os mineiros sem a prestação de serviços essenciais para a garantia da ordem e segurança da sociedade”.

A proibição de greve de policiais militares foi ratificada em 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que estendeu o impedimento a policiais civis, federais, rodoviários federais, ferroviários federais e bombeiros, entre outros agentes de segurança. O comandante-geral da Polícia Militar de Minas, coronel Rodrigo Rodrigues, no entanto, liberou os protestos. Em nota, divulgada no sábado, ele referendou o movimento, mas evitou criticar diretamente o governo.

“Trata-se de um evento legítimo, inclusive com a participação de quem ombreia na ativa ou ombreou o bom combate (veteranos e da reserva) e estabeleceu alicerces para estarmos onde estamos. Unidos, teremos garantido os nossos direitos e a defesa e proteção do povo mineiro”, afirma a nota.

ENTRE BOLSONARO E MORO

Zema foi eleito, em 2018, na onda do bolsonarismo, mas, ao longo do mandato, manteve uma relação de idas e vindas com o presidente Jair Bolsonaro. No início do mês, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) se reuniu com o governador para costurar um palanque na eleição. Zema também vem sendo cortejado pelo presidenciável do Podemos, Sergio Moro.

Em 1997, um motim no estado provocou uma morte e gerou uma onda de protestos em 14 estados. Naquele ano, três mil policiais civis e militares foram às ruas da capital mineira e entraram em choque com a guarda do Palácio da Liberdade, antiga sede do governo mineiro. Um cabo da PM, que tentava conter a manifestação, foi baleado e morreu. Em outubro do ano passado, a Assembleia de Minas anistiou 182 militares que participaram do motim e foram expulsos da instituição.