O GLOBO, n 32.341, 22/02/2022. Economia, p. 12
Governo deve anunciar após o carnaval pacote de crédito de R$ 100 bi
Geralda Doca e Raphaela Ribas
Buscar uma solução para reduzir a inadimplência nas linhas de financiamento e renegociação de dívidas são pontos-chave
O governo prepara medida provisória (MP) para relançar nos próximos dias linhas de crédito criadas durante a pandemia para pequenos empreendedores, micro, pequenas e médias empresas. Segundo integrantes da equipe econômica, o pacote ainda está sob análise e só deve ser publicado depois do carnaval. Um dos pontos-chave é como resolver o problema da inadimplência, principalmente entre pequenas empresas.
Com a projeção de liberar até R$ 100 bilhões, a medida tem como foco três modalidades: Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (Peac); o Programa de Estímulo ao Crédito (PEC), destinado a Microempreendedores Individuais (MEI) e pescadores; e o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e de Pequeno Porte (Pronampe).
O objetivo é atender empresas que faturam até R$ 300 milhões por ano. Segundo técnicos a par das discussões, a medida não deve exigir recursos novos. A ideia é usar verba dos fundos garantidores de crédito, que foram fomentados pelo Tesouro Nacional para dar suporte às operações, cobrindo parte da inadimplência das carteiras dos bancos.
PRAZO DE ATÉ 48 MESES
O dinheiro aportado pelo Tesouro entra como garantia à operação, deixando o juro mais baixo. O entendimento do Ministério da Economia é que a verba que não foi usada como garantia não precisa retornar aos cofres da União e pode ser reaplicada.
Os bancos privados querem que o governo crie mecanismos para reduzir a inadimplência dos programas e condições diferenciadas para renegociação de dívidas. Segundo dados do Sebrae, a taxa média no Pronampe, destinado a empresas com faturamento de R$ 360 mil a R$ 4,8 milhões por ano, está em 2,6% —abaixo do mercado, de 4,6% —, mas tende a crescer, diante da conjuntura econômica.
Paulo Solmucci, da Abrasel, associação de bares e restaurantes, a inadimplência é bem maior:
—Em torno de 20% dos empresários de bares e restaurantes não conseguem pagar empréstimos feitos pelo Pronampe. E o número deve chegar a 50% nos próximos meses. A retomada de movimento e faturamento não cobre a inflação de alimentos, combustível, aluguel e energia.
O analista de Serviços Financeiros do Sebrae, Giovanni Beviláqua, destaca a piora nas condições de crédito no ano passado. Segundo ele, a taxa média de juros nos empréstimos foi subindo, de 26,5% ao ano no primeiro trimestre, até chegar a 31,1% no último trimestre. No período, a taxa média de inadimplência dos pequenos negócios passou de 4% para 4,5%.
Enquanto a equipe econômica prepara a MP, o Congresso Nacional começa a avaliar projetos para impedir uma escalada na inadimplência das operações contratadas até o ano passado.
Um projeto do deputado Efraim Filho (DEM-PB) quer autorizar a renegociação das dívidas do Pronampe em até 48 meses, com juros limitados a 6% ao ano. Pelas regras do programa, os juros cobrados são de Selic —elevada neste mês para 10,75% ao ano — mais 1,25% o ano.
O Peac e o Peac Maquininhas (com crédito obtido via máquinas de cartão) têm por trás o Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), gerido pelo BNDES. Já o Pronampe tem o Fundo Garantidor de Operações (FGO), administrado pelo Banco do Brasil.
RECURSOS DO SEBRAE
O governo negocia com o Sebrae a possibilidade de a entidade aportar recursos próprios no Fundo de Aval às Micro e Pequenas Empresas (Fampe), em parceria com BNDES e Caixa Econômica Federal. A projeção de liberar R$ 100 bilhões para as empresas considera a verba existente nos fundos garantidores, segundo técnicos da equipe econômica.
Segundo dados do Sebrae, as modalidades resultaram em 1,242 milhão de operações e um volume de financiamento de R$ 82,1 bilhões.
As linhas tem condições distintas, como juros, prazo de pagamento e carência, mas as taxas são inferiores às cobradas pelo mercado.
Para acelerar a tramitação da MP no Congresso, técnicos do governo defendem que o senador Jorginho Mello (PL-SC), autor de projeto que fortalece o Pronampe, seja o relator da proposta.