O GLOBO, n 32.342, 23/02/2022. Política, p. 8

“A Justiça Eleitoral brada por respeito'', diz Fachin

Mariana Muniz



Ministro assumiu ontem a presidência do TSE em meio aos ataques de Bolsonaro, que não compareceu à cerimônia

Em um discurso repleto de recados, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin assumiu ontem a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cargo no qual permanecerá até agosto, quando terminará seu mandato na Corte. O magistrado pregou “tolerância, disposição para o diálogo e o compromisso inarredável com a verdade dos fatos”. E disse que a Justiça Eleitoral “não se renderá”. Ele também destacou a importância das liberdades de expressão e de imprensa.

Fachin assume o posto em meio aos ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral e à integridade das urnas eletrônicas, após uma campanha derrotada pelo Congresso em prol do voto impresso. Caberá a Fachin preparar o tribunal para as eleições presidenciais, que ocorrerão em outubro, ocasião em que o TSE será presidido por outro integrante do STF, Alexandre de Moraes, empossado ontem vice-presidente da Corte eleitoral. O titular do Palácio do Planalto recusou o convite para a cerimônia, que ocorreu virtualmente.

O novo presidente do TSE afirmou que a Corte será “implacável” na defesa da Justiça Eleitoral:

—O Brasil merece mais. A Justiça Eleitoral brada por respeito. E alerta: não se renderá. Cumprir a Constituição da República se impõe a todos: o Brasil é uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Ele criticou a disseminação de notícias falsas, práticas pela qual Bolsonaro já foi acusado, e falou sobre a importância de os candidatos respeitarem o resultado do pleito deste ano.

Segundo Fachin, a desinformação não tem a ver “com a distorção sistemática da verdade, isto é, com a normalização da mentira”.

— A desinformação vai além e diz também com o uso de robôs e contas falsas, com disparos em massa, enfim, com todas as formas de comportamentos inautênticos no mundo digital. Diz, mais, com a insistência calculada em dúvidas fictícias, bem ainda com as enchentes narrativas produzidas com o fim de saturar o mercado de ideias, elevando os custos de acesso a informações adequadas —apontou.

Fachin e Moraes foram ao Palácio do Planalto, no início do mês, entregar a Bolso o convite para a posse. Na ocasião, Bolsonaro afirmou que era importante manter aberto um canal de diálogo com os magistrados. Depois disso, porém, voltou a atacar os dois ministros, o que já fez em diversas ocasiões desde que chegou ao poder.

Em seu discurso, ontem, Fachin anunciou as principais diretrizes da sua gestão, entre elas uma agenda reuniões com cada um dos presidentes dos partidos políticos para dialogar sobre o combate à desinformação. Na sequência, ele agradeceu a colaboração dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). E não citou Bolsonaro.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, acusado de blindar Bolsonaro em mais de uma ocasião, também fez uso da palavra. Ele defendeu que a “a democracia não é apenas a vontade da maioria”.

— É também o respeito ao direitos das minorias. É também o equilíbrio institucional que se consolida com respeito entre os membros dos poderes republicanos. Em tempos em que a técnica jurídica é assediada pela paixão política, devemos redobrar a nossa convicção: a de que o fundamento de nossas ações e decisões está na Constituição e nas leis —disse.

Edson Fachin, de 64 anos, integra o TSE desde 2018. Ele é doutor em Direito pela PUC-SP e tomou posse como ministro do Supremo em junho de 2015, após ser indicado pela então presidente Dilma Rousseff (PT).