O GLOBO, n 32.347, 28/02/2022. Brasil, p. 7

GAROTAS E GAROTOS NOTA MIL

Luisa Marzullo*


A história das jovens  estrelas do Enem que gabaritaram provas 

Todo mundo já viu as clássicas imagens de estudantes explodindo de felicidade quando passam no vestibular. No último Enem, alguns milhares passaram por isso ao vencer a disputa anual pela difícil vaga para entrar na universidade, sobretudo nos cursos mais disputados das instituições públicas. Mas imagina a sensação de Giovanna Dias, de 19 anos, moradora de Fortaleza, que não só ganhou a vaga para Medicina na universidade federal de seu estado como tirou a maior nota de redação. É a garota no tamil.

A estrela na redação do Enem deste ano, que teve cerca de 3 milhões de inscritos, encarou um duplo desafio: a produção de texto é uma das etapas mais temidas pelos alunos e, no último concurso, abordou “Invisibilidade e registro civil”, tema cuja importância foi exaltada pelos professores, mas considerado inesperado e complexo pelos candidatos. Giovanna conta que seu segredo foi a persistência. No ano anterior, ela havia treinado muito, mas não atingiu seu objetivo final.

— No primeiro ano, tirei 980, tive muito medo de relaxar e a nota cair. Por isso, continuei treinando. Quando estava muito cansada, fazia pelo menos o esquema do que colocaria em cada parte do texto — conta ela, que ganhou a vaga para Medicina na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

As primeiras listas de convocações do Sistema Unificado de Seleção (Sisu), que permitem ao estudante saber se consegue a vaga ou não a vaga, começaram a sair na terça-feira da semana passada. A relação de todas as notas, entretanto, ainda não foi divulgada. No ano passado, ela permitiu saber que apenas 28 inscritos tiraram nota máxima em redação — total que vem caindo e deve cair mais este ano —e que a maior pontuação de matemática foi 975 e de humanas, 862,6.

FERA EM MATEMÁTICA

João Pedro Moraes, de 19 anos, já sabe que, em 2022, faz parte desta constelação que deixa as famílias de queixo caído: ele gabaritou a prova de matemática, o que lhe garantiu a nota máxima de 953,1. Carioca e morador do bairro da Tijuca, o jovem é o único da família da área de exatas, mas sempre foi estimulado a estudar.

— Desde pequeno, fazia parte de olimpíadas acadêmicas de matemática e física. É o que eu gosto e sempre tive apoio dentro de casa — diz João, que com o feito em matemática obteve o terceiro lugar no disputadíssimo curso de Engenharia de Produção da UFRJ.

—Meu foco no vestibular era o IME (Instituto Militar de Engenharia) e ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica, que são provas muito mais específicas e densas. Acredito que, por isso, o Enem acabou sendo mais fácil para mim.

João explica ainda que o maior desafio da prova é o tempo de duração. Nos dois dias de provas em finais de semana diferentes, o candidato tem cinco horas para resolver 90 questões. O primeiro dia tem meia hora a mais por conta da redação.

— É preciso bolar uma estratégia. Eu sabia que matemática é a minha área, e as pessoas costumam não acertar tanto. Então foquei no que sou bom, o que me ajudou na hora do TRI (sistema da prova que classifica as questões como fáceis, médias e difíceis com base em estatísticas de erros e acertos dos candidatos) —explica.

Na área de Humanas, quem brilhou foi Samyra Martins, de 18 anos, de Castanhal, no Pará, cidade cuja origem remonta à história dos índios Tupinambás. Ela foi aprovada em quarto lugar para a Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS). Samyra está tão realizada que não a preocupa o fato de que terá de se mudar:

— Não planejei me mudar, mas não vai ser isso que vai me impedir de fazer o curso. Este foi meu segundo ano tentando.No primeiro, foi difícil com o ensino a distância. Tive muito apoio do meu pai, mas infelizmente ele faleceu antes de saber que eu tinha passado no Enem. Mas é tudo por ele.