O GLOBO, n 32.349, 02/03/2022. Economia, p. 12
Exportação de alta tecnologia ainda não voltou ao pré pandemia
Gabriel Shinohara
Resultados de vendas externas foram concentrados em “commodities”, diz CNI
Apesar dos números recordes de exportação no ano passado, um setor acabou ficando para trás e ainda não recuperou o patamar de vendas para o exterior pré-pandemia: o da indústria de alta e média tecnologia. Uma pesquisa elaborada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e obtida exclusivamente pelo GLOBO mostra que as exportações de maior valor agregado e inovação em 2021 somaram US$ 39,8 bilhões, patamar inferior aos US$ 41,2 bilhões de 2019.
Ou seja, a venda destes produtos sofreu uma queda de 3,4% nesta comparação, na contramão das exportações em geral, que turbinadas pela alta dos preços das commodities, passaram de US$ 224 bilhões em 2019 para US$ 280,4 bilhões no ano passado, um avanço de 25,2%. A CNI classifica como produtos de alta ou média tecnologia, dependendo de cada item, exportações do setor aeronáutico, químico, farmacêutico, eletrônicos e de máquinas, entre outros setores.
O gerente de Políticas de Integração Internacional da CNI, Fabrizio Panzini, explica que as indústrias que utilizam mais tecnologia costumam precisar de insumos importados e as cadeias globais de produção ainda não normalizaram. Junta-se a isso a falta de competitividade do setor no mercado internacional, e a atividade econômica mais fraca na América Latina, um dos principais destinos dos produtos brasileiros.
—Se você não consegue ter esse preço e essa diferenciação tecnológica, você não consegue inserção no mercado internacional. Olhando no retrovisor vemos que esse movimento já vinha acontecendo e se aprofundou com a pandemia —disse Panzini.
O presidente-executivo da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, ressaltou que o setor sofreu bastante durante a pandemia com aumento de preços e diminuição de rotas aéreas e marítimas internacionais. Ele espera que essa recuperação, que começou na segunda metade de 2021, continue neste ano, que tem a América Latina, Europa e Estados Unidos como principais mercados.
— O câmbio real desvalorizado e o combate à Covid através de uma vacinação mais intensa não só no Brasil, mas em outras economias também seriam as principais razões da retomada das exportações —explicou.
O setor mais longe de retornar ao patamar pré-crise é o aeronáutico e aeroespacial. Segundo o estudo da CNI, as exportações no ano passado foram de US$ 2,7 bilhões, 50,6% abaixo dos US$ 5,5 bilhões registrados em 2019. A pandemia afetou as viagens nacionais e internacionais e, por consequência, a demanda por aeronaves. Na Embraer, a venda total de jatos, que foi de 198 aeronaves em 2019, caiu para 130 no ano seguinte e subiu para 141 no ano passado.
No caso do setor de produtos médico-hospitalares, de odontologia, de reabilitação e laboratórios, a restrição do governo federal na exportação desse tipo de produto por causa da pandemia da Covid-19 afetou o setor.
— Em 2021, nós praticamente mantivemos quase o mesmo valor de exportação que tínhamos em 2020, US$ 481 milhões, mas ainda abaixo de 2019, e porquê? Porque esses produtos ainda continuaram proibidos para exportação. Aliás, as empresas sofreram muito porque o governo deixou de comprar os produtos, mas não permitiu a sua exportação —disse Paulo Fraccaro, superintendente da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo).
Flávia Carvalho é representante de uma empresa que vende produtos cirúrgicos, mas preferiu não revelar o nome da companhia. Segundo ela, as exportações ainda não atingiram o nível pré-pandemia por causa da redução de cirurgias eletivas e da dificuldade que a pandemia trouxe para a cadeia de produção:
— Há problema de produção, ainda não voltou ao normal a questão do fornecimento dos componentes. A Ômicron trouxe um outro problema porque a gente teve redução do pessoal da fábrica. A gente voltou no Natal com menos 30% do pessoal para trabalhar. Tudo isso gera impacto.